(Um resumo das ponderações de Venter e de Francis Collins, chefe do Projeto Genoma Humano, nos 10 anos do anúncio do sequenciamento, pode ser lido aqui)
Essa necessidade de esmagar números em grande escala é fruto do reconhecimento do fato de que a correlação simples "um gene = uma característica" é mais uma exceção que uma regra. O corpo humano é fruto de uma rede complexa de interações e feedbacks dos genes entre si, dos genes com seus produtos, dos produtos entre si, e de tudo isso com o meio ambiente.
Mas se o genoma ainda deve demorar a produzir resultados palpáveis na medicina, ele já teve efeitos muito interessantes em outros campos da ciência -- por exemplo, na determinação do grau de parentesco do homem com animais como o chimpanzé e o camundongo.
A genômica permite, de fato, dispor os seres vivos num espectro contínuo, onde uma espécie dá lugar a outra por meio do acúmulo de uma série de mudanças moleculares que, vistas isoladamente, podem até parecer irrelevantes. É como se, na escala do DNA, a velha distinção aristotélica entre "essência" e "acidente" perdesse toda a razão de ser. Ou como se, na história da vida na Terra, as essências não passassem de vários acúmulos de acidentes.
Outro ponto a destacar é o caráter imprevisível dos avanços da ciência. Como se vê nesta linha do tempo, o DNA foi descoberto num estudo de espermatozoides de peixes. Quase posso ouvir alguém comentando, lá nos idos de 1869: "Estudar espermatozoide de peixe? Que perda de tempo!"