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Cobras invasoras ameaçam coelhos no sul da Flórida

Estudo de campo comprovou que as pítons-da-Birmânia se transformaram no maior predador de coelhos nativos do Parque Nacional Everglades, depois de terem sido introduzidas no ecossistema por criadores particulares

Por Herton Escobar
Atualização:

Píton em meio à vegetação do parque. Crédito: Don Filpiak/UF  Foto: Estadão

Dica de amigo ao coelhinho da Páscoa: Mantenha-se longe do Parque Nacional Everglades, no sul da Flórida. Cobras invasoras da Ásia estão devorando os coelhos nativos de lá, segundo um estudo publicado na revista Proceedings B, da Royal Society de Londres.

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Já faz algumas décadas que a fauna silvestre deste simbólico parque norte-americano vem sentindo os efeitos da invasão de pítons-da-Birmânia (Python bivittatus), uma cobra de origem asiática que se alimenta de mamíferos e pode passar facilmente dos 5 metros de comprimento. Elas começaram a aparecer por lá na década de 1980 -- provavelmente introduzidas por proprietários particulares, que as tinham como bichos de estimação --, e desde então sua população foi crescendo, até "explodir" no início dos anos 2000.

Ao mesmo tempo que crescia a população de cobras exóticas, cientistas notaram que começava a declinar a população de coelhos, gambás, guaxinins e outros pequenos mamíferos nativos do parque -- assim como de seus predadores naturais, linces e coiotes. Um trabalho publicado em 2012 na revista PNAS confirmou essa relação estatística, dando a entender que as pítons eram as responsáveis pelo declínio acentuado da fauna local. Em especial o coelho-do-brejo (Sylvilagus palustris), antes muito abundante em todo o parque, chegou a desaparecer de algumas áreas ocupadas pelos répteis.

"Para o público em geral, esse trabalho de 2012 foi suficiente para colocar a culpa nas pítons e encerrar a questão. Entre os cientistas, porém, muitas questões continuaram em aberto", disse ao Estado o pesquisador Robert McCleery, do Departamento de Ecologia e Conservação de Vida Selvagem da Universidade da Flórida, autor principal do novo estudo.

McCleery, entre outros, não estava ainda convencido de que a presença das pítons era suficiente para explicar um declínio populacional tão acentuado de mamíferos do parque. Que as cobras estavam se alimentando deles era fato, mas seriam elas as verdadeiras e únicas responsáveis pelo sumiço da fauna nativa? Afinal, outros fatores poderiam estar envolvidos: mudanças climáticas, alterações no ciclo hidrológico do parque, poluição por mercúrio, doenças. Só porque duas coisas aparentemente relacionadas acontecem ao mesmo tempo não significa que uma está causando a outra.

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Estudo de campo

Para tentar solucionar o mistério, McCleery desenvolveu um experimento engenhoso: liberou coelhos em áreas equivalentes dentro do parque (com pítons) e fora do parque (sem registro de pítons), e monitorou o que acontecia com eles por meio de coleiras equipadas com rádio-transmissores. Nove meses depois, todos os 95 coelhos monitorados estavam mortos, mas a diferença das causas de morte entre os grupos foi grande. Dentro do parque, 17 coelhos (mais de 70%) foram devorados por pítons e apenas 2, por outros predadores (ave de rapina e lince). Fora do parque, mais de 70% dos coelhos foram devorados por predadores naturais (aves de rapina, linces, crocodilos e cascavéis), e nenhum por pítons.

O que isso significa? Segundo McCleery, ainda não é possível dizer que as pítons são as únicas responsáveis pelo desaparecimento de mamíferos do parque, mas não resta dúvida de que elas se tornaram predadoras ativas de coelhos-do-brejo nos Everglades, com óbvio impacto na população dessa espécie.

"Agora podemos parar de tentar adivinhar qual é o problema e começar a lidar com ele de fato", afirma o cientista. O foco agora, segundo ele, deve ser na remoção das pítons, para tentar restaurar o equilíbrio natural de presas e predadores do ecossistema. O problema é que ninguém sabe ainda como fazer isso. Apesar de já haver dezenas de milhares de cobras no parque, elas são extremamente difíceis de detectar em meio à vegetação. "Não tem como ir lá, simplesmente procurar e sair capturando as cobras", diz McCleery. "Precisamos descobrir alguma característica na biologia ou na ecologia delas que nos permita atraí-las para um mesmo local (como uma isca), e aí sim, removê-las."

Trata-se de um caso semelhante ao do peixe-leão, que também começou na Flórida e se espalhou nas últimas décadas por todo o Caribe. Veja: http://goo.gl/EQa2tX

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Um coelho-do-brejo vendado para colocação da coleira com rádio-transmissor. Crédito: Adia Sovie/UF  Foto: Estadão
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