Estudo mostra que oeste do Saara já foi coberto por rios

Usando satélites que detectam características do subsolo arenoso, cientistas revelaram uma série de extintos leitos fluviais

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Por Fabio de Castro
Atualização:

O oeste do Saara, hoje coberto de areia, foi no passado uma imensa área verdejante coberta por uma vasta rede de rios. A conclusão é de um novo estudo publicado nesta terça-feira, 10, na revista Nature Communications.

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Há anos os cientistas descobriram no Oceano Atlântico, na costa da Mauritânia, a oeste do deserto, resíduos e canais submarinos que indicavam a existência, em algum momento do passado, de grandes rios desaguando na região. 

Agora, usando uma técnica de imageamento por satélite capaz de detectar o que há no subsolo, pesquisadores conseguiram a primeira prova direta de que havia mesmo uma bacia de rios de 520 quilômetros de extensão onde hoje só existe deserto.

O mapa mostra em azul as principais bacias fluviais atuais da África - do Nilo, do Congo, do Níger e do Senegal. Em cinza, aparece a provável extensão do rio Tamanrasett, onde hoje está a parte ocidental do deserto do Saara. Foto: Nature Communications

De acordo com a autora principal do estudo, Charlotte Skonieczny, do Instituto Francês de Pesquisa sobre Exploração do Mar (Ifremer, na sigla em francês), a vasta rede de rios do Saara existiu - e voltou a desaparecer - em vários períodos ao longo dos últimos 245 mil anos.

As imagens de radar obtidas com um satélite japonês revelou partes do antigo sistema fluvial em camadas rasas da superfície arenosa da Mauritânia. 

Esses canais enterrados, entretanto, provavelmente faziam parte do Tamanrasett, um rio hipotético que os cientistas acreditam ter se estendido por 500 quilômetros através do Saara ocidental, com nascente nas montanhas Atlas e no planalto de Hoggar, na atual Argélia.

Em cinza, aparece o vale do rio Tamanrasett, cuja bacia deve ter sido reativada nos últimos Períodos Úmidos Africanos. Em azul claro, os leitos de rios localizados pelos satélites no estudo atual. Em azul escuro, o Cânion do Cabo Timiris, descoberto em 2003, aparece alinhado ao extinto sistema fluvial. Foto: Nature Communications

Segundo os pesquisadores, o sistema fluvial era reativado a cada vez que ocorria um dos chamados Períodos Úmidos Africanos. Nesses períodos, todo o norte da África - atualmente desértico - adquiria um clima semelhante ao do Quênia atual, com zebras, leões e girafas circulando por savanas e pastagens. 

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De acordo com os cientistas, a água deve ter corrido pelo rio Tamanrasett pela última vez há cerca de 5 mil anos. "Se ainda existisse atualmente, o rio Tamanrasett seria o 12º maior da Terra", escreveram os cientistas.

Os leitos de rios localizados pelos satélites sob as dunas do deserto alinham-se quase perfeitamente com um grande cânion submarino - descoberto em 2003 e batizado de Cânion do Cabo Timiris -, que se estende a partir da costa da Mauritânia por três quilômetros oceano adentro, com cerca de 2,5 quilômetros de largura e um quilômetro de profundidade em alguns pontos. 

Os cientistas também haviam descoberto no oceano profundo, na região do Cânion do Cabo Timiris, a presença de material granulado fino, provavelmente originário de rios, além de um grande canal submarino escavado na plataforma continental da costa do Saara Ocidental.

Tudo levava a crer que já houve uma rede fluvial considerável desaguando na região, mas até agora não havia nenhuma prova direta de sua existência. O alinhamento dos antigos leitos de rios sob a areia com a região do cânion demonstra pela primeira vez que o Tamanrasett não era só uma especulação.

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