Estudo sugere que médicos receitam antibióticos em doses inadequadas

Pesquisa realizada na Unifesp comparou as prescrições de antibióticos e os efeitos das quantidades administradas nos três tipos mais comuns de bactérias causadoras de infecções respiratórias

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Por Fernanda Bassette
Atualização:

SÃO PAULO - Pesquisa realizada na cidade de São Paulo sugere que os médicos estão prescrevendo antibióticos em doses menores do que as que seriam adequadas ou que são ineficazes para o tratamento de doenças respiratórias, como pneumonia, faringite e sinusite.

A conclusão é de uma simulação feita pelo Laboratório Especial de Microbiologia Clínica da Unifesp - os resultados foram publicados na revista científica BMC Infectious Diseases. O risco da prescrição de antibióticos em doses inadequadas ou errados para o tipo de doença é o aumento da resistência ao medicamento e, consequentemente, uma maior dificuldade no tratamento. É para evitar resistência, por exemplo, que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) passou a exigir a retenção de uma via da receita na venda dessas drogas. “A resistência ocorre porque a pessoa ingere a droga, mas não elimina as bactérias. Assim, elas podem ser transmitidas entre as pessoas”, diz o infectologista Carlos Kiffer, autor da pesquisa. A pesquisa. Por meio de um modelo matemático (simulação de Monte Carlo), os pesquisadores compararam as prescrições de antibióticos e os efeitos das doses nos três tipos mais comuns de bactérias: Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae e Moraxella catharralis. Para o estudo foi considerada uma amostra de receituários emitidos por 400 médicos de São Paulo - os dados referem-se a prescrições feitas na comunidade e não em hospitais e foram informados pela IMS Health. Foram analisadas as receitas, o tipo de infecção diagnosticada e as doses de antibiótico recomendadas. Os resultados sugerem que os antibióticos mais prescritos não apresentaram a taxa de resposta esperada (acima de 90%). São eles: Azitromicina, ( 27,4% das prescrições), seguido do Amoxicilina (15,4%) e do Levofloxacina (14,7%). Os pesquisadores esperavam um índice alto de sucesso nos antibióticos mais comuns, mas observaram uma boa taxa de resposta só em três das drogas prescritas: Gatifloxacina, Moxifloxacina e Amoxicilina-Clavulanato. Elas figuram entre as menos prescritas no ranking. “Essas drogas são mais novas, menos conhecidas. Isso significa que provavelmente as doses não estão obtendo sucesso frente a estas bactérias”, diz Kiffer. De acordo com ele, as infecções respiratórias costumam ter baixa morbidade: cerca de 70% a 80% dos pacientes conseguem resolver o problema espontaneamente. O problema, explica, são os outros 20% a 30% de doentes, que podem ter alguma complicação e, por isso, precisam receber a dose correta do medicamento. Se houver resistência à droga, o tratamento será mais difícil. O infectologista Antônio Carlos Pignatari, professor titular da Unifesp, diz que os resultados demonstram que é necessário que os médicos reconsiderem o tipo de terapia que estão recomendando. “Estão receitando a dose e o próprio antibiótico inadequadamente”, diz. Mundo ideal. Para Kiffer, no mundo ideal, o correto seria o médico colher material do paciente, examinar e identificar se o problema é causado por vírus ou bactéria. E, de acordo com o resultado, prescrever o antibiótico correto para aquela doença. “Mas estamos longe do mundo ideal. Raramente são colhidos exames e a disponibilidade de testes rápidos ainda é limitada. Mesmo quando se colhem exames, os resultados demoram cerca de 72 horas para ficarem prontos. E o médico não vai esperar, ele vai e, muitas vezes, deve medicar o paciente na hora”, diz. Renato Grinbaum, infectologista do Hospital Beneficência Portuguesa, diz que a simulação de Monte Carlo traz sugestões e não resultados definitivos - que só poderiam ser comprovados por meio de estudos clínicos. “Os resultados sugerem que as dosagens deveriam ser individualizadas. Como é quase impossível fazer isso com os pacientes, a sugestão é usar esses antibióticos em doses um pouco maiores”, diz Grinbaum. “O problema é que dose maior pode aumentar efeito colateral, e isso o estudo não demonstra”, avalia.P

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