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Homem já vivia na Austrália há 65 mil anos, diz estudo

Datação foi possível depois que uma nova escavação no norte do país revelou 11 mil artefatos de pedra

Por Fabio de Castro
Atualização:

O Homo sapiens surgiu no leste da África há mais de 200 mil anos e, há cerca de 70 mil, começou a se dispersar por vários continentes. A época de sua chegada à Austrália, porém, era considerada incerta. Agora, um novo estudo apresentou provas de que os primeiros povos já viviam no atual território australiano há 65 mil anos.

A nova pesquisa, publicada nesta quarta-feira, 19, na revista Nature, revela que a chegada à Austrália ocorreu bem antes do que muitos arqueólogos imaginavam. A estimativa mais aceita, com base na descoberta de uma série de artefatos pré-históricos, era de 47 mil anos atrás.

O machado de pedra descoberto no norte da Austrália é o mais antigo já encontrado no mundo, com cerca de 65 mil anos; estudo revelou que nessa época os humanos já haviam chegado à Oceania. Foto: Chris Clarkson / Gundjeihmi Aboriginal Corporation 2015.

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A descoberta foi feita por um grupo de cientistas, sob a liderança de Chris Clarkson, da Universidade de Queensland, em Brisbane (Austrália), depois de novas escavações no sítio arqueológico de Madjedbebe, no norte da Austrália, onde já haviam sido escavados os vestígios mais antigos de presença humana no país.

Os vestígios da presença humana no sítio de Madjedbebe já sugeriam que a chegada humana àquela área havia ocorrido entre 50 mil e 60 mil anos atrás, mas havia dificuldade na datação dos artefatos encontrados no local.

Com as novas escavações, concluídas em 2015, a equipe coordenada por Clarkson descobriu cerca de 11 mil novos artefatos na camada mais densa e profunda das cavernas de Madjedbebe. Os exemplares incluem ferramentas de pedra lascada, pedras de amolar e a mais antiga machadinha já registrada.

O arqueólogo Chris Clarkson (ao centro), líder da equipe de escavações,e seus colegas Richard Fullagar e Elspeth Hayesexaminam uma rara pedra de amolar encontrada nas camadas mais profundas da escavação. Foto: Dominic O'Brien / Gundjeihmi Aboriginal Corporation

"O sítio contém a mais antiga tecnologia de machados de pedra do mundo, as mais antigas pedras de amolar da Austrália e evidências de setas de pedra finamente esculpidas, que devem ter servido como pontas de lanças", disse Clarkson.

Para realizar a datação, os autores do estudo avaliaram cuidadosamente a posição exata de cada artefato encontrado, como forma de garantir que eles tinham a mesma idade dos sedimentos de cada camada escavada. O grupo utilizou então avançadas técnicas de datação para definir a idade mais exata possível de cada elemento.

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Extinção animal

Segundo Clarkson, os resultados obtidos permitem saber qual a idade mínima da dispersão dos humanos para fora da África, em direção à Ásia. A descoberta indica que os humanos chegaram ao continente antes da extinção da megafauna australiana - uma grande quantidade de animais de grande porte que existiu na região durante a pré-história.

Três machados encontrados em diferentes camadas do sítio arqueológico e uma pedra de afiar de formato retangular extraída da camada correspondente a 65 mil anos atrás; artefatos revelam que presença humana na Austrália é mais antiga do que se pensava. Foto: Dominic O'Brien / Gundjeihmi Aboriginal Corporation

Em um comentário sobre o estudo, publicado na mesma edição da Nature, o arqueólogo Curtis Marean, do Instituto de Origens Humanas da Universidade Estadual do Arizona (Estados Unidos), afirma que a nova pesquisa sugere participação humana na extinção da megafauna australiana.

"Um outro estudo publicado em 2016 mostrou que os primeiros humanos chegaram ao árido interior da Austrália há cerca de 49 mil anos e apresentou evidências fósseis da megafauna associadas a artefatos de pedra. Juntando os dois estudos, temos uma importante evidência de que os humanos já estavam na Austrália cedo o suficiente para causar a extinção da megafauna", disse Marean.

A arqueóloga Elspeth Hayes e o líder tradicional aborígene Mark Djandjomerr extraem amostras comparativas em uma caverna adjacente ao sítio de Madjedbebe, onde os cientistas descobriram mais de 11 mil artefatos de pedra; estudo revelou que homem já vivia na Austrália há 65 mil anos. Foto: David Vadiveloo / Gundjeihmi Aboriginal Corporation

Sítio aborígene

O sítio arqueológico de Madjedbebe fica nas terras tradicionais do povo Mirarr, cercadopelo Parque Nacional Kakadu, considerado patrimônio da humanidade. O sítio é localizado em uma terra aborígene excluída do parque nacional por causa da abertura de uma mina de urânio, em 1982. A mina pertence agora à empresa Energy Resources of Australia.

O local já foi escavado quatro vezes desde a década de 1970. A última das escavações, liderada por Clarkson, foi realizada entre 2012 e 2015, em parceria com a comunidade Mirarr. 

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"Agora sabemos que os humanos modernos, depois de deixarem a África há cerca de 70 mil anos, dispersaram-se rapidamente para uma área costeira que se tornou o ponto de partida para sua jornada até a Austrália. A partir dali, talvez alguns deles tenham imaginado outras terras além do mar. Eles decidiram construir barcos, carregá-los com suas tecnologias e, com suas famílias, embarcaram para uma viagem de descobertas", escreveu Marean.

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