Cadê todo mundo?

Acho que ninguém consegue escrever sobre ciência durante muito tempo sem cair na tentação de cometer um comentário sobre a Questão de Fermi. É uma espécie de rito de passagem. E com o fim-de-semana chegando, talvez os leitores se interessem em gastar algum tempo livre para  pensar  no assunto...

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Bom, para quem não está familiarizado com este problema em particular: a Questão de Fermi deve o nome ao físico italiano Enrico Fermi (1901-1954), ganhador do Prêmio Nobel de 1938 e um dos criadores da primeira bomba atômica, que a propôs durante um almoço com outros cientistas em 1950 (para um relato detalhado das circunstâncias e da questão em si, dê uma olhada aqui). De forma bem resumida, a "questão" é: onde estão os extraterrestres?

Não é uma pergunta tão tola quanto parece. Os cálculos exatos são meio demorados e um tanto quanto tediosos, mas levando-se em conta a idade da nossa galáxia, a Via-Láctea (cerca de 8 bilhões de anos) o tamanho dela (100.000 anos-luz), as estrelas que contém (mais de 200 bilhões) e o tempo que a Terra levou para produzir vida inteligente (uns 4 bilhões de anos), parece surpreendente que (a) nenhuma outra civilização tecnológica tenha nos precedido em toda a galáxia, e que (b)ainda não tenhamos encontrado nenhum sinal dela.

 Foto: Estadão

PUBLICIDADE

"Sinal dela" não significa discos-voadores ou outros óvnis (que são um assunto à parte) mas coisas mais comezinhas, como ondas de rádio, sondas robóticas (a humanidade, que está no espaço há meros 60 anos, já tem sondas iniciando o avanço pelo espaço interestelar) ou fenômenos astronômicos sem explicação natural e que indicariam a presença de tecnologias avançadíssimas no espaço -- por exemplo, geradores sugando toda a energia de uma estrela.

(Um monolito preto entre os anéis de Saturno também não cairia mal, claro)

Bom, então: seria lógico encontrar algum sinal do tipo. Nenhum foi encontrado. Por quê? As explicação mais simples é a de que estamos sozinhos. Vida pode ser abundante lá fora, mas vida inteligente, capaz de viajar pelo espaço, é uma exclusividade da Terra.

Publicidade

Além de desanimadora, essa explicação geralmente é acusada de arrogante. "Como se pode imaginar", vai o argumento, "que de todas as estrelas da galáxia, apenas a nossa tenha produzido uma raça com o magnífico privilégio de demonstrar teoremas e compor sinfonias?"

De uns tempos para cá, venho me perguntando se a verdadeira "arrogância" não estaria em considerar que "teoremas e sinfonias" são algo de "magnífico". Digo, é meio suspeito alguém achar que, só porque se faz uma coisa bem, essa coisa é a mais importante do mundo. Aves voam, peixes respiram debaixo d'água, bactérias reproduzem-se sem sexo. Do ponto de vista de cada um desses seres, esses talvez sejam, também, "privilégios magníficos".

Minha resposta à Questãode Fermi -- totalmente provisória e passível de revisão a qualquer momento -- é a seguinte: inteligência não é, do ponto de vista da evolução, uma coisa muito inteligente.

Veja os dinossauros: existiram por quase 200 milhões de anos (ainda existem, de certo modo, na forma de seus descendentes, os pássaros) e só sumiram por causa de um acidente cósmico.

Veja a humanidade: os primeiros vestígios de primatas capazes de criar ferramentas datam de 2 milhões de anos atrás-- 1% do tempo de existência dos dinossauros -- e, nos últimos 50 anos desse período, começamos a flertar com o suicídio coletivo por meio de guerra, superpopulação, mudança climática.

Publicidade

Então, que tal essa: não há outras civilizações tecnológicas na Via-Láctea, mas não porque a humanidade tenha sido especialmente ungida para um papel de protagonista no drama cósmico. Mas, simplesmente, porque espécies que produzem civilizações tecnológicas não são, no fim das contas, uma boa ideia.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.