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O Universo foi feito para nós, ou vice-versa?

Já que estamos no assunto da vida na Terra, em particular, e no Universo, em geral (o tema fez sucesso ontem), vou cumprir uma promessa que fiz algum tempo atrás na seção de comentários de uma postagem anterior e falar um pouco sobre o chamado "princípio antrópico".  Esse princípio nasce da constatação de que, uma vez que estamos aqui, as leis do Universo devem permitir que existamos.

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Por Redação
Atualização:

Soa meio bocó, não? Parece mais ou menos como dizer que, já que 2+2=4, então as regras da aritmética têm de ser tais que 2+2=4. Dã.

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Mas há quem veja no princípio antrópico sutilezas ocultas. Elas dependem, basicamente, da interpretação que se procura dar ao enunciado. Em sua forma mais simples,o princípio apenas lembra que a existência de vida como a conhecemos deve ser levada em conta na elaboração das descrições do Universo.

É mais ou menos como deduzir que a pessoa que está sentada na sua frente no metrô tem uma mãe biológica, porque sem mãe biológica a pessoa não estaria ali.

Foi assim que o astrofísico (e escritor de ficção científica) Fred Hoyle previu uma característica específica do carbono-12, necessária para facilitar a formação desse tipo de núcleo atômico no interior das estrelas. A característica depois foi descoberta na prática. Hoyle chegou a sua previsão raciocinando a partir da abundância de carbono-12 observada nos seres vivos.

Mais polêmica é a chamada forma "forte" do princípio, que afirma que o Universo tem um ajuste fino para produzir e sustentar vida. O princípio forte faz da vida uma espécie de causa final do Universo.

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A visão, digamos, darwiniana -- de que a vida é uma acidente que se aproveita de condições favoráveis -- é virada de cabeça para baixo: as condições é que conspiram para ser favoráveis, e a vida é um resultado inevitável.

Isso, no entanto, soa como uma inversão do princípio e causa e efeito --como a velha piada de que os narizes foram feitos para suportar os óculos. Ou a fábula daágua empoçada, que se maravilha ao notar como o buraco onde está parece ter sido criado por uma inteligência superior e amorosa, já que tem o formato exato para contê-la, e com todo o conforto.

Os defensores do princípio "forte" costumam ainda lembrar que se qualquer uma das constantes fundamentais da natureza -- como a velocidade da luz, ou a massa do próton -- fosse um pouco diferente, toda a cadeia de fenômenos físicos e químicos que levam à vida como a conhecemos seria quebrada; logo, o Universo em que vivemos é extremamente improvável.

Confesso que o argumento não me parece muito bom. Primeiro, porque denota uma certa falta de imaginação, como se vida como a conhecemos fosse a única realmente possível.

É certo que a variação de uma ou duas constantes universais -- enquanto as outras leis e constantes da natureza se mantêm -- poderia inviabilizar até mesmo a formação de átomos, mas e se todas as leis e constantes variassem livremente? É concebível que exista uma infinidade de combinações capazes de dar origem a algo que talvez até nós, com todo o nosso provincianismo, reconhecêssemos como "vida".

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