Herton Escobar
04 de dezembro de 2010 | 14h27
Mosquitos transmissores de doenças são exemplos de espécies invasoras disseminadas pelo mundo. (Photo: James Gathany, Centres for Disease Control and Prevention, USA)
Só para contextualizar um pouco mais o tema do último post … Esse caso do peixe-leão é um exemplo perfeito do problema das “espécies invasoras”. Muita gente acha que isso é apenas alguma aberração curiosa, mas, na verdade, segundo os especialistas, as espécies invasoras são a segunda maior ameaça global à preservação da biodiversidade. Só perdem para a perda de hábitat (desmatamento e coisas desse tipo). Imagine só!
Há muitos outros exemplos. Um deles, também de origem aquática, é o das tilápias. As tilápias são peixes predadores de origem africana. Foram introduzidos no Brasil para piscicultura, mas acabaram escapando para o ambiente e, uma vez soltos nos rios brasileiros, tornam-se uma espécie invasora. Comem os peixes menores e ainda competem com os outros peixes nativos por espaço e alimento. Tomaram conta até do lago do Parque Ibirapuera … Tem também o mexilhão-dourado, um molusco asiático que entope tubulações em represas e hidrelétricas, causando um prejuízo danado (mais informações neste link da Eletrobras)
Um
Segundo a organização The Nature Conservancy (TNC), que tem um programa grande de pesquisa sobre esse tema, as espécies invasoras causam um prejuízo anual global de US$ 1,4 trilhão (valor equivalente a 5% da economia mundial). Isso inclui os custos tanto do impacto causado diretamente pelas espécies quanto dos esforços necessários para combatê-las.
Neste site do programa Global Invasive Species Database é possível ver uma lista das 100 piores espécies invasoras do mundo.
As espécies invasoras são plantas e animais introduzidos pelo homem em ecossistemas/regiões nos quais elas não existiam originalmente. Se for uma espécie “inofensiva”, tudo bem … é o caso de praticamente toda a nossa agricultura brasileira, como mencionei num post anterior. Nesse caso, as espécies são chamadas “exóticas”, mas não necessariamente “invasoras”, porque podem ser controladas e não oferecem perigo para as espécies nativas. Se for uma espécie predadora, como no caso do peixe-leão e da tilápia, porém, isso torna-se um problema.
Em outros casos, a espécie invasora pode ser uma ameaça à saúde humana. Pombos e ratos são exemplos clássicos, disseminados pelo mundo todo. Sem falar nos mosquitos, vírus, bactérias, parasitas e outras pestes (mais informações neste artigo da pesquisadora Marcia Chame, da Fiocruz). Também há o problema das pragas agrícolas … Quando você chega a um outro país e tem de preencher aquele formulário de imigração perguntando se você está trazendo algum tipo de alimento ou se esteve em áreas rurais recentemente, isso é justamente para evitar a entrada de pragas agrícolas no país, que podem ser um vírus, uma bactéria, um fungo, um inseto.
Vários leitores mostraram uma certa indignação com a opção de matar os peixes-leão. Claro que essa não é uma solução agradável. Mas antes matar o peixe-leão do que deixar que ele mate as espécies nativas e destrua os recifes de coral … não é verdade? As espécies nativas e o ecossistema não deveriam pagar o preço dos erros humanos.
Um leitor sugeriu introduzir no ecossistema alguma outra espécie que coma o peixe-leão e, assim, controlar sua população “naturalmente”. É uma estratégia chamada “controle biológico”, e de fato pode funcionar (é muito usada na agricultura, para o controle de pragas), mas é preciso ser muito bem planejada, ou o tiro pode sair pela culatra. Foi o que aconteceu em Fernando de Noronha … Para controlar a população de ratos da ilha, algumas décadas atrás, os militares introduziram alguns lagartos teiú, achando que os répteis comeriam os ratos. Só tem um problema: o lagarto é um animal diurno e o rato, um animal noturno. Ou seja: os dois nunca se encontram na natureza. Resultado: os teiús não só não resolveram o problema dos ratos como viraram um problema a mais, pois se alimentam dos ovos de aves e tartarugas nativas da ilha. Desastre total.
Abraços a todos.
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