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Ministério busca recursos nos exterior para reforçar caixa da ciência brasileira

Em entrevista exclusiva, ministro Celso Pansera diz que 2015 foi um ano "muito virtuoso", apesar das dificuldades, e anuncia estratégia internacional para "irrigar" o sistema de ciência, tecnologia e inovação com recursos em 2016

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Por Herton Escobar
Atualização:

O ministro Celso Pansera. Foto: Ascom/MCTI

Não vai faltar dinheiro para a ciência brasileira em 2016, diz o ministro Celso Pansera, após um ano de vacas magras em que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) teve seu orçamento reduzido em 26%*, vários editais deixaram de ser lançados e houve atrasos no pagamento de projetos.

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Apesar das dificuldades relatadas pela comunidade científica, Pansera considera que 2015 foi um ano "muito virtuoso", em que todas as dívidas da pasta foram quitadas. "Colocamos em dia todo o caixa do ministério", disse o ministro, em entrevista exclusiva ao Estado, três meses depois de assumir o comando da pasta, no início de outubro.

Leia também: Ciência brasileira entra em crise com perda de recursos

O cenário para 2016, segundo Pansera, é favorável, apesar da crise econômica. Motivos: O programa Ciência sem Fronteiras não será mais financiado com recursos do Fundo Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (FNDCT), e o ministério planeja investir fortemente na captação de recursos no exterior. Na quarta-feira foi assinado em Pequim um acordo entre os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) para criação de um fundo de R$ 24 milhões, dedicado ao financiamento de projetos conjuntos de pesquisa. O Brasil contribuiu com R$ 1,2 milhão do bolo, e o primeiro edital deve ser lançado em abril.

Leia abaixo os destaques da entrevista.

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O ano passado foi muito difícil para a ciência brasileira, por conta da escassez de recursos. Quais são as perspectivas para 2016?

O grande problema em 2015 foi que o orçamento começou a funcionar muito tarde -- só foi sancionado em maio -- então foi um ano que existiu pela metade. O ministério tomou a decisão de aproveitar o ano para pagar dívidas e compromissos assumidos em 2013 e 2014, e nisso foi feliz. Colocamos em dia todo o caixa do ministério; nesse sentido foi um ano muito virtuoso. Agora, em 2016, estamos voltando a jogar para fora. Nas próximas semanas vamos anunciar um conjunto de iniciativas no sentido de jogar dinheiro dentro do sistema de pesquisa e inovação brasileiro. Obviamente, em meio a uma crise fiscal, mas com um governo que está apostando em saídas de longo prazo para o país.

De onde vai sair o dinheiro para essas iniciativas?

Olha, nós temos o Funttel, o FNDCT, os fundo setoriais, como o do petróleo (...). E o BNDES, que está com caixa mais reforçado, já nos colocou R$ 2 bilhões à disposição, e estamos tentando buscar mais dinheiro com ele.

Esses R$ 2 bilhões estão disponíveis para o MCTI gastar como quiser?

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Hoje a Finep tem R$ 4,5 bilhões em caixa com esse dinheiro. Então podemos pagar todos os compromissos que já temos para esse ano e assumir mais R$ 2 bilhões ou R$ 3 bilhões de novos financiamentos para inovação. Então é um dinheiro bom. Também conseguimos tirar o Ciência sem Fronteiras do FNDCT, então o dinheiro do fundo volta a incentivar pesquisas e o Ciência sem Fronteiras volta a sair de verbas vinculadas ao Ministério da Educação. Então, temos iniciativas que vão caminhar para irrigar o sistema brasileiro de inovação.

Essa saída do Ciência sem Fronteiras do FNDCT já está sacramentada?

Sim, é uma decisão de governo.

Em 2015 houve muito atraso no pagamento de editais e outros auxílios à pesquisa. Como está essa situação? Já foi tudo pago?

Vou te dar um número: Só nas primeiras semanas deste ano nós pagamos R$ 66 milhões de editais de anos anteriores. Liquidamos todas as dívidas. Estamos pagando agora o CT-Infra, que são os investimentos em infraestrutura nas universidades (...). Outra coisa: Em 31 de dezembro nós pagamos R$ 30 milhões para um grande projeto, que é uma obra do PAC, que vai construir a autonomia do Brasil na produção de radiofármacos.

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Vamos anunciar em fevereiro-março um conjunto de iniciativas para buscar dinheiro no exterior"

O que se pode esperar com relação ao orçamento do MCTI em 2016?

É um orçamento que reflete um final de ano passado que foi muito duro do ponto de vista fiscal, mas o governo está tomando iniciativas positivas. Contamos, inclusive, com dinheiro que será arrecadado com a repatriação de recursos e com a criação da CPMF para voltar a respirar; e nesse contexto o MCTI terá um reforço de caixa. Além disso, estamos buscando dinheiro no exterior, com um conjunto de operações junto à União Europeia e ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), e conversando com a Fazenda nacional. Vamos anunciar em fevereiro-março um conjunto de iniciativas para buscar dinheiro no exterior.

A negociação daquele empréstimo de US$ 2,5 bilhões do BID continua?

Sim, ela segue em frente. Estamos marcando uma ida ao BID para fevereiro, em Nova York, para tratar desse assunto. Já tínhamos avançado bastante nisso com o ministro Levy e agora estamos negociando com o ministro Barbosa, porque precisamos da autorização do governo e depois do Congresso (para receber o empréstimo). É um dinheiro que virá ao longo de 6 anos, com juros muito baixos, para cinco eixos do desenvolvimento científico brasileiro: biotecnologia, nanotecnologia, segurança alimentar, setor aeroespacial e tecnologias da informação e comunicação (TICs), particularmente para a questão de segurança cibernética.

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Em 2015 houve muitos cortes e contingenciamentos ao longo do ano, por conta da situação econômica do país. No caso de um agravamento da crise em 2016, haveria como blindar o MCTI de novos cortes?

Veja, nós fechamos o ano com todos os nossos institutos sem nenhuma dívida; com o sistema todo funcionando, e com algumas dívidas antigas todas quitadas. O que estamos lançando agora é com previsão de orçamento seguro, de dinheiro que nós teremos. É duro, é um momento de crise, não há como negar isso; mas também há um esforço para que o nosso sistema de pesquisa não pare. O Brasil precisa agregar valor ao que produz, precisa deixar de ser o país das commodities, e eu acho que há essa compreensão dentro do governo e na sociedade, o que facilita o nosso trabalho.

É duro, é um momento de crise, não há como negar isso; mas também há um esforço para que o nosso sistema de pesquisa não pare"

O que o senhor vê como prioridade para o ministério nesse momento?

Uma das coisas que estamos definindo com o Itamaraty é que teremos quatro linhas de trabalho internacional. Primeiro, vamos reforçar nossa relação com o Mercosul, para criar e reforçar uma cadeia regional de pesquisa e desenvolvimento científico. Vamos fazer um grande seminário em fevereiro na Argentina para avançar nesse sentido. A segunda linha é a União Europeia, com a qual já temos bons convênios e queremos fazer outros. Eles têm muito dinheiro para pesquisa lá, e muito interesse no Brasil sobre questões como segurança alimentar, biomassa, biocombustíveis e controle das áreas oceânicas. A terceira linha é com a comunidade de língua portuguesa, que tem a facilidade da língua e da cultura.

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Por fim, temos os BRICS. Uma delegação do ministério viajou à China para retomar um conjunto de agendas de pesquisa e financiamento com eles, que ficou um pouco parada no ano passado, mas queremos retomá-las no sentido de buscar financiamento para pesquisa e inovação. É esse protagonismo que estamos buscando retomar com muita força, e que será uma das marcas aqui do ministério em 2016.

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*Veja abaixo os dados finais de orçamento repassados à reportagem pelo MCTI. O ministério tinha um orçamento de R$ 7,3 bilhões para trabalhar em 2015, dos quais R$ 1,9 bilhão foi contingenciado pelo ajuste fiscal de maio. Outros R$ 800 milhões ainda foram contingenciados depois disso, segundo informações da Agência CT&I; mas, segundo o ministério, foram recuperados por meio de "anulações de cortes" e "novas liberações de limites".

 Foto: Estadão
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