A origem secreta das mitocôndrias

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Por Redação
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Imagine só: As mitocôndrias, aquelas organelas em forma de lingüiça responsáveis pela respiração e produção de energia nas nossas células, são descendentes de bactérias que se "infiltraram" em organismos primitivos bilhões de anos atrás, quando a vida na Terra estava só começando. Ou seja, o principal instrumento celular que você usa hoje para respirar já foi, um dia, uma bactéria. Esse é o passado secreto das mitocôndrias, que nem todo professor gosta de contar na escola. Mas ele pode nos ensinar muitas coisas sobre como o nosso organismo evoluiu e como ele funciona. Pode, inclusive, ter a ver com o fato de você ser mais magro ou mais gordo, segundo as pesquisas mais recentes. O resumo da história é o seguinte: todas as formas de vida na Terra podem ser divididas em dois grandes grupos - eucariotos e procariotos. Os eucariotos, como nós, são organismos formados por células mais complexas e maiores, dotadas de núcleo e de várias organelas (entre elas, as mitocôndrias). Os procariotos são organismos muito mais simples, como as bactérias, formados por uma única célula sem núcleo e com poucas organelas. Hoje, essa diferença é óbvia. Mas bilhões de anos atrás, quando tudo começou, eucariotos e procariotos não eram assim tão diferentes. Em algum momento, as trilhas evolutivas dos dois grupos se cruzaram. Uma bactéria aeróbica, que já era capaz de metabolizar oxigênio, invadiu a célula de algum eucarioto primitivo, oferecendo a ele seus serviços respiratórios em troca de abrigo. Os dois chegaram a um acordo e, no fim, deu tudo certo: o eucarioto fornecia proteção para a bactéria, que, em troca, processava oxigênio e produzia mais energia para a célula - uma parceria chamada na biologia de endossimbiose. Acelere o filme mais alguns bilhões de anos e cá estamos nós, respirando alegremente, com nossas células recheadas de ex-bactérias que viraram mitocôndrias. Isso não é história da minha cabeça não - há uma série de evidências científicas que sustentam a teoria. A mais óbvia delas é que as mitocôndrias possuem seu próprio DNA, diferente do nosso e idêntico ao das bactérias e de outros procariotos. É o chamado DNA mitocondrial, que tem a forma de um anel e não de uma dupla hélice, como o DNA "clássico" do núcleo das células. A mitocôndria, portanto, tem seus próprios genes e até seus próprios ribossomos para síntese de proteínas. É quase um organismo independente. Por que isso interessa para nós? Bem, porque sem as mitocôndrias, a gente não existiria. "A mitocôndria, como se costuma dizer, é a bateria da célula, é de onde vem toda a energia para o nosso organismo funcionar", diz a especialista Alicia Kowaltowski, professora do Departamento de Bioquímica da Universidade de São Paulo (USP). As mitocôndrias são as nossas principais produtoras de ATP, a molécula básica de energia do organismo. É dentro delas que ocorrem os processos bioquímicos que transformam a energia contida nos alimentos em energia que pode ser de fato utilizada pelo organismo, por meio da respiração. Conseqüentemente, os cientistas estão descobrindo que o número de mitocôndrias que você tem dentro das suas células e a eficiência com que elas funcionam tem tudo a ver com a maneira como você metaboliza os alimentos. E, portanto, com o seu peso e a sua saúde. "Os estudos mostram que há uma relação muito grande entre regulação mitocondrial e doenças metabólicas, como obesidade e diabetes", explica Alicia. Pense nisso a próxima vez que respirar. PS: Não posso deixar de dedicar essa coluna a minha prima Camila, que sempre que me perguntam sobre o que eu faço na vida, responde por mim: "Ele escreve sobre mitocôndrias." E não é que é verdade! 

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