Arqueólogos usam georadar em São Paulo

Sítio histórico será "varrido" por equipamento, que "enxerga" através do solo até a profundidade de 3 metros.

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Por Agencia Estado
Atualização:

Descobrir "tesouros" enterrados antes de começar a cavar é uma das funções do georadar, equipamento desenvolvido na Itália e que será utilizado pela primeira vez em São Paulo, na avaliação de um sítio histórico urbano, localizado na zona leste da cidade. Os "tesouros" localizados e retratados não são exatamente do tipo que mobiliza piratas ou caçadores de arcas perdidas, mas podem ser muito valiosos para quem se dedica à investigação do passado da humanidade através das antigas construções, instrumentos e obras de arte. A área a ser "varrida" com a nova tecnologia arqueológica não-invasiva é o Sítio do Capão. Trata-se de uma das poucas casas do século XVIII ainda intactas na metrópole paulistana, ocupada durante algum tempo pelo Regente Feijó (Padre Antônio Diogo Feijó, Regente do Brasil entre 1835 e 1837, durante a minoridade de D. Pedro II). A construção é tombada pelo Condephaat e Patrimônio Histórico Municipal, e consta do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos. Segundo explica o arqueólogo Paulo Zanettini, coordenador do projeto de avaliação, a casa será restaurada, mas antes passará por uma verdadeira "tomografia computadorizada", para identificação de áreas de interesse para escavações. Além de mostrar as condições estruturais do edifício, evitando o comprometimento durante as obras de restauro, a análise pode confirmar a existência de vestígios pré-coloniais no entorno da casa. O georadar, ou GDR, é multifreqüencial e multicanal, explica Jamile Dehaini, geofísica da Ingenieria Dei Sistemi (IDS), a empresa italiana que fará a prospecção. Como qualquer radar, o equipamento emite sinais, que penetram no solo ou nas estruturas do edifício, retornando, como um eco, ao encontrar obstáculos e formando imagens de acordo com a resposta. A diferença é que, neste caso, são usadas 3 freqüências (600, 400 e 200 MHz) simultâneas e 6 antenas diferentes. A leitura é monoestática - o sinal é transmitido e captado na mesma antena -, biestática (o sinal é emitido por uma antena e captada por outra) e crospolar (o sinal é transmitido por uma antena perpendicular à antena de recepção). Tudo isso para criar uma imagem tridimensional do solo, onde é possível visualizar não só os obstáculos mais próximos da superfície, mas, muitas vezes, também o que está por trás deles. "Antes de ser feita uma varredura, toda a cartografia do lugar é colocada num software, no computador, de modo que cada objeto ou estrutura que aparece na imagem fica bem localizado e o calibramento de sua posição é constante", observa Jamile. Isso dá alta precisão à leitura, que ainda pode ser complementada com as imagens de um radar de 100 MHz, para profundidades maiores. Nos solos arenosos ou em determinados tipos de rocha, os sinais penetram cerca de 10 metros. Nos solos argilosos, como o de São Paulo, a penetração dos sinais é muito menor e a expectativa é de atingir até 3 metros. O produto final se parece muito com a imagem de uma tomografia, com os diferentes objetos ou estruturas coloridos artificialmente, para melhor visualização. Num teste do equipamento, realizado na Villa Adriana, em Tivoli, Roma, foi localizado um túnel de 80 cm de largura por 15 metros de comprimento, revestido de pedra, que pode ter sido um canal de drenagem de águas pluviais ou de transporte de água para as termas, localizadas naquela propriedade. O canal estava a 1 metro de profundidade e transformou-se numa nova frente de escavações arqueológicas. "Os recursos arqueológicos de uma nação são finitos e tende-se a escavar o menos possível", lembra Zanettini. "A Arqueologia virtual vem ganhando grande impulso em todo o mundo, pois permite que os cientistas conheçam de antemão o sítio que irão escavar".

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