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Brasil, o paraíso dos cientistas estrangeiros

São mais de 2 mil. Vários vieram para alguns meses e foram ficando, ficando...

Por Agencia Estado
Atualização:

Andrew Simpson. Um dos maiores nomes da ciência nacional não soa nada brasileiro. E nem é. O homem que revolucionou a pesquisa genômica no País nasceu na Inglaterra, mas vai a churrascaria pelo menos uma vez por semana e adora frutas tropicais. "Só a possibilidade de tomar suco de laranja fresco todo dia já me faz sentir no paraíso", brinca Simpson, sem qualquer preocupação em esconder o forte sotaque britânico. "Com um pão de queijo, então, ainda melhor." No Brasil há 12 anos, casado e com dois filhos, o pesquisador do Instituto Ludwig, no Hospital do Câncer em São Paulo, é apenas um dos mais de 2 mil cientistas estrangeiros trabalhando atualmente no País. Alguns estão só de passagem. Muitos, como Simpson, chegaram para um período e não saíram nunca mais. Qualidade As delícias culinárias, as praias, o samba e o carnaval são fortes atrativos. A qualidade e a infraestrutura de pesquisa, no entanto, não deixam por menos. "Em termos de ciência, o Brasil é um dos melhores lugares do mundo para exercer a profissão. São Paulo é perfeito", afirma Simpson, convicto. "Aqui eu consigo fazer qualquer coisa e competir em qualquer área. Não tenho o menor motivo para sair daqui." Muitos cientistas com experiência em instituições de excelência na Europa e nos EUA também são atraídos pelo desafio de vencer fronteiras e contribuir para o desenvolvimento do País. "Aqui eu sinto que posso fazer coisas novas", conta o russo Igor Polikarpov, de 47 anos, pesquisador do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, em São Carlos. "Em outros lugares as pesquisas já estão muito estabelecidas. É tudo muito mais rígido, e isso, às vezes, restringe o pesquisador." Convite Especialista em cristalização de proteínas, Polikarpov mudou-se para o Brasil em 1995. Veio para fazer algumas palestras na Universidade Estadual de Campinas e foi convidado para participar da construção do acelerador de partículas do futuro Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, o único do tipo no Hemisfério Sul. Depois de passar pelo Instituto Max Planck, na Alemanha, e pela Universidade de Edimburgo, na Escócia, o russo aceitou o desafio dos brasileiros. "Sinto que minhas pesquisas podem dar uma contribuição maior aqui do que se estivesse na Europa ou nos EUA." "Há muito para ser feito no Brasil e isso é um dos motivos pelo qual prefiro estar aqui", concorda o inglês Simpson. "Aqui tenho um sentimento mais forte de que estou contribuindo para um futuro melhor." Desde que chegou ao Brasil, em 1989, Simpson publicou mais de 130 trabalhos e hoje é reconhecido como uma autoridade internacional em pesquisa genômica. Não que ele não fizesse sucesso na sua terra natal, onde pesquisava parasitas para o National Institute for Medical Research, em Londres. "Minha carreira estava indo muito bem. Com 35 anos, já tinha o que muitas pessoas não conseguem em uma carreira inteira", conta. "Mas não tinha muito para onde ir, pois doenças parasitárias não são uma prioridade na Inglaterra." Começou a ficar entediado. Então pediu seis meses de licença e veio fazer um trabalho de colaboração com amigos do Centro de Pesquisas René Rachou, em Belo Horizonte. Nunca mais voltou. "Já estava com as malas prontas quando decidi ficar. Foi uma decisão puramente emocional. Nada pior do que estar em um lugar querendo estar em outro." "Acho a vida no Brasil atraente", diz Simpson, de 47 anos, que está se naturalizando brasileiro. "Aqui tem mais sol, calor e comida boa. As pessoas têm mais calor humano. Todos os clichês são verdadeiros." A hospitalidade e o carinho dos brasileiros também conquistaram o bioquímico canadense Brian Bandy, que veio para o Brasil em 1996 e ainda está indeciso se volta ou não para o Canadá. "As pessoas aqui tem alegria, energia, o que me agrada muito", diz o pesquisador, que faz pós-doutorado no Instituto de Química da USP com uma bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Futebol Bandy conta que veio para São Paulo sabendo pouco sobre o Brasil e quase nada sobre o Instituto de Química. Conhecia apenas o trabalho do seu supervisor, Etelvino Bechara, e isso foi suficiente. "Foi bom descobrir que a qualidade da pesquisa aqui era tão alta." O canadense, que estuda reações químicas na mitocôndria, está impressionado com o espírito de cooperação dos brasileiros - outra característica apreciada pelos estrangeiros. Uma coisa que Bandy conhecia muito bem sobre o Brasil era o futebol, seu esporte do coração. Acabou virando são-paulino, a não ser quando é obrigado pela namorada a torcer para o Palmeiras. "O primeiro jogo que vi quando cheguei aqui foi um Corinthians e Palmeiras. Teve tanta violência que decidi que não torceria para nenhum desses times." "Considero-me mais brasileiro do que inglês." O pesquisador inglês Jeffrey Jon Shaw foi convencido a vir para o Brasil por causa de um parasita. Ainda nos anos 50, quando era aluno de doutorado na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, foi estudar protozoários na América Central e voltou com uma doença misteriosa que, descobriria mais tarde, era leishmaniose. Intrigado, resolveu mudar-se para Belém, no Pará, para estudar a doença em colaboração com o Instituto Evandro Chagas. A pesquisa começou em 1965 e continua até hoje, na Universidade de São Paulo, onde Shaw é professor-titular do Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas. "O meu campo aqui é enorme. Fico fascinado com tudo que há para descobrir", diz Shaw, que recentemente identificou dois roedores como os hospedeiros naturais do protozoário causador da forma mais comum de leishmaniose no País. Hoje, com 63 anos, Shaw mora com a mulher brasileira e os dois filhos em Brasília e não se preocupa em visitar muito a Inglaterra. "Considero-me mais brasileiro do que inglês." O físico nuclear Rajendra Narain Saxena também se identificou com a cultura brasileira, segundo ele, mais compatível com sua herança indiana do que a do Canadá, onde fez pós-doutorado na Universidade de Waterloo. "As pessoas são mais calorosas, mais hospitaleiras, tal como o povo indiano", compara. Chefe do Centro do Reator de Pesquisas do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), em São Paulo, Saxena veio para o Brasil em 1973, convidado pelo professor José Goldemberg. "Vim com a clara convicção de que ficaria apenas um ano. Mas gostei do ambiente de trabalho e resolvi ficar." O bioquímico Hamza El-Dorry também não troca a vida no Brasil por nada. Nem pelo Egito, sua terra natal, nem pelos EUA, onde fez pós-doutorado e deu aula na Universidade de Cornell. "Aqui não tem briga nem guerra", diz El-Dorry, de 57 anos, professor-titular do Departamento de Bioquímica do Instituto de Química da USP. "O povo aqui vive com tranqüilidade, mesmo com a diversidade de raças e religiões. É fantástico. Você não encontra isso em nenhum outro lugar."

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