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Brasil vai inaugurar estação antártica na próxima terça-feira

Com 17 laboratórios de pesquisa e segurança antifogo reforçada, nova Comandante Ferraz será entregue oito anos após incêndio

Foto do author Luciana Garbin
Por Luciana Garbin
Atualização:

O Brasil inaugura terça-feira a nova Estação Antártica Comandante Ferraz. Com capacidade para 64 pessoas, ela substituirá a base destruída por um incêndio em fevereiro de 2012 e é apontada por pesquisadores como uma das mais modernas da região.

Pré-montada na China, estrutura foi levada de navio à Antártida e pode suportar ventos de até 200 km/h Foto: CLAYTON DE SOUZA/ESTADAO

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“A nova estação brasileira hoje é a maior estrutura de pesquisas da Península Antártica. E certamente está entre as maiores estações de pesquisa antártica do mundo”, afirma o professor da Universidade de Brasília Paulo Câmara, em sua sexta temporada na Antártida.

São 17 laboratórios de pesquisa - 14 internos e 3 externos -, que servirão principalmente para estudos de Microbiologia, Biologia Molecular, Química Atmosférica, Medicina, Ecologia e mudanças ambientais.

Planejada pelo escritório de arquitetura Estúdio 41 e construída pela chinesa Ceiec, vencedora de concorrência internacional, a nova estação custou US$ 99,6 milhões e impressiona pela estrutura à prova de ventos de até 200 km/h, solos congelados e abalos sísmicos. 

As obras começaram no final de 2015. Suas fundações foram pré-montadas em Shangai e levadas de navio para a Ilha Rei George, onde ficam estações de Brasil e outros países. Assim como os pilares, estruturas e contêineres. Para aplacar o trauma do incêndio que matou dois militares há oito anos, a segurança virou quase obsessão e acabou ampliando a nova Comandante Ferraz. O projeto original tinha 3,3 mil m², mas a estação ficou com 4,5 mil m², em boa parte por segurança. É quase o dobro da antiga, que tinha 2,6 mil m². 

“A nova estação será uma oportunidade de mostrar nosso valor como país, pois estamos inaugurando uma estrutura de ponta, que colocará nossos pesquisadores no topo da pesquisa antártica”, afirma o secretário da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, almirante Sérgio Guida.

Segundo ele, uma comitiva com 45 autoridades, militares, pesquisadores e assessores deve participar da inauguração na terça-feira, mas o presidente Jair Bolsonaro desistiu de ir. Ele será substituído pelo vice, Hamilton Mourão. Três ministros também confirmaram presença: Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), Fernando Azevedo e Silva (Defesa) e Marcos Pontes (Ciência). De lá, eles devem participar de uma videoconferência com Bolsonaro.

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Durante a inauguração será feita a entrega provisória da estação pela empresa chinesa - a definitiva só deve ocorrer com o fim do pagamento, previsto em contrato para 2022. Segundo a Marinha, US$ 60 milhões já foram pagos. 

Setenta chineses ainda trabalhavam nesta terça-feira, 7, na estação. A maioria deve ir embora em 31 de março. Alguns poucos permanecerão para ajudar na manutenção durante o inverno.

Terminada a construção, a atenção agora se concentra nos investimentos no Programa Antártico Brasileiro (Proantar), que há anos sofre com a inconstância na liberação de recursos. De acordo com o almirante Guida, a verba para logística está garantida. Um convênio de R$ 400 milhões com a Petrobrás garantirá recursos e combustível por cinco anos para a estação e os navios que operam na região, e emendas parlamentares têm ajudado a fechar as contas. 

Ciência

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Na área das pesquisas científicas, porém, a questão é mais delicada. “O desafio é criar estrutura mais estável para o lado científico do Proantar. Hoje perdemos para todos os países do Brics em investimentos em ciência antártica. Só a África do Sul tem um programa na região equivalente ao brasileiro”, diz o professor Jefferson Simões, vice-presidente do Comitê Científico Internacional Sobre Pesquisa Antártica. “A nova Ferraz é a casa do Brasil na Antártida, tem importância tanto geopolítica quanto para ciência, mas o Proantar é mais amplo que ela.”

Simões lembra que só 25 % da pesquisa antártica brasileira será feita na Comandante Ferraz - o restante é realizado no Navio Polar Almirante Maximiano, em acampamentos e num módulo a 2,5 mil quilômetros. “O trabalho mais profundo é feito nas universidades e institutos de pesquisas. O desafio nos próximos anos é o financiamento dos laboratórios no Brasil.”

Pesquisa sobre DNA de plantas e fungos ajuda a testar laboratórios

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Uma pesquisa sobre DNA de plantas e fungos antárticos é a primeira feita na nova estação brasileira. Realizada pelos professores Paulo Câmara, da Universidade de Brasília, e Luiz Henrique Rosa, da Universidade Federal de Minas Gerais, ela terá seus resultados apresentados na inauguração, terça-feira.

Luiz Rosa, da UFMG, e Paulo Câmara, da UnB Foto: Paulo Câmara e Luiz Henrique Rosa

Um dos propósitos do estudo foi testar os novos laboratórios da estação. “A gente fazia a pesquisa e, ao mesmo tempo, testava equipamentos, via se a energia não caía, se as tomadas estavam adaptadas”, afirma Câmara. 

Segundo o professor, a estrutura da nova estação possibilitou um salto grande na pesquisa, porque permite já extrair o DNA na Antártida e só sequenciá-lo no Brasil. “Antes só era possível fazer o trabalho na universidade meses depois e muitas vezes o DNA se perdia ao longo do caminho, porque o navio demora para chegar. Agora a gente já pode estabilizar o DNA na Antártida e só tem de levá-lo num tubinho pequenininho para o Brasil para sequenciá-lo.”

A estrutura da nova estação possibilitou um salto grande na pesquisa Foto: Paulo Câmara e Luiz Henrique Rosa

Luiz Henrique Rosa conta que um de seus grandes interesses na Antártida são fungos que produzem antibióticos. Após isolá-los e cultivá-los em placas, o professor extrai as substâncias que eles produzem e as testa contra causadores de dengue, doença de Chagas e outros males tropicais.

Outro foco das pesquisas são substâncias que possam ser usadas como pesticidas e herbicidas na agricultura. “Como micro-organismos da Antártida estão isolados geograficamente há muito tempo, eles podem ter linhagens selvagens que podem produzir substâncias muito úteis como remédios.”

Outro foco das pesquisas são substâncias que possam ser usadas como pesticidas e herbicidas na agricultura Foto: Luiz Henrique Rosa
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