Cientistas anunciam sequenciamento do genoma da vaca

Código genético da vaca corresponde em 80% ao humano, coinciência maior que a de camundongos

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Pesquisadores descrevem na edição desta semana da revista Science o sequenciamento do genoma de um animal bovino da espécie Bos taurus, revelando, pela primeira vez, o que distingue o gado dos seres humanos e de outros mamíferos. O genoma do boi consiste de pelo menos 22 mil genes, e é mais parecido com o humano com a estrutura genética dos camundongos, dizem os cientistas: o genoma humano corresponde em 80% ao da vaca.

 

PUBLICIDADE

Além disso, o genoma do gado parece ter sofrido uma reorganização significativa desde que a linhagem divergiu da dos demais mamíferos, diz o cientista da Universidade de Illinois Harris Lewin, cujo laboratório criou o mapa dos cromossomos bovinos usado na montagem do genoma. A pesquisa contou com a participação de cerca de 300 cientistas de 25 países, incluindo o Brasil.

 

"Entre os mamíferos, o gado tem um dos genomas mais altamente reorganizados", disse Lewin. "Eles parecem ter mais translocações e inversões (de fragmentos de cromossomo) que outros mamíferos que são parentes próximos".

A sequência dos 29 pares de cromossomos da vaca e do cromossomo X (o Y não foi estudado) também oferece uma nova compreensão da evolução bovina e das características que tornam o gado útil para a humanidade, disse Lewin.

 

Uma característica forte no genoma bovino, dizem os cientistas, é o grande número de sequências repetidas nas regiões dos cromossomos que tendem a se quebrar quando a célula duplica sua carga genética para a produção de óvulos ou espermatozoides.

 

"O genoma da vaca tem muitos tipos de repetições, que se acumulam com o tempo", disse Lewin. "E uma das coisas que descobrimos é que as repetições novas estão invadindo onde as velhas estavam nas regiões de quebra, e destruindo-as. Esta é a primeira vez que vemos isso".

 

"As repetições podem fazer muita coisa", disse ele. "Podem mudar a regulação dos genes. Podem tornar os cromossomos instáveis e aumentar a probabilidade de recombinação com outros pedaços, de forma inadequada".

Publicidade

 

Outra análise, conduzida por Seongwon Seo, atualmente professor da Universidade Nacional Chungnam, na Coreia do sul, mostrou que cinco dos 1.032 genes que controlam funções metabólicas em humanos estão ausentes na vaca, ou foram radicalmente modificados. Isso sugere que o gado tem algumas características metabólicas únicas, diz Lewin.

 

Participação brasileira

 

No Brasil, o sequenciamento contou  com apoio da Universidade Estadual Paulista (Unesp), da Universidade de São Paulo (USP) e da Embrapa. O pesquisador José Fernando Garcia, especialista em genômica da Unesp e integrante do consórcio internacional, compara a conclusão do sequenciamento a abertura de uma caixa-preta, repleta de informações anteriormente desconhecidas ou dispersas em centros de pesquisa pelo mundo.

 

"Está a disposição da sociedade uma biblioteca completa e única com informações do DNA bovino que serão exploradas pela comunidade científica para resolver questões práticas que afetam os rebanhos", diz.

 

Para Garcia, o desafio futuro está em explorar com maior profundidade o genoma para a solução de questões cruciais da atualidade relacionadas principalmente à produção de alimentos. "O Brasil pode sair na frente na seleção de características de interesse econômico e padronização da produção de carne", exemplifica o pesquisador referindo-se a cadeia que tem grande importância econômica para o País e necessita de informações estratégicas. "Hoje, o Brasil detém o maior rebanho comercial do mundo, porém, ainda perde pela venda de produto com baixo valor agregado", comenta o pesquisador.

 

Evolução

 

Outra cientista envolvida no estudo, Theresa Casey, focalizou os genes responsáveis pelo leite e pela lactação, e preparou um artigo para revista Genome Biology discutindo como o genoma ligado à lactação bovina ajuda a entender a evolução da linhagem dos mamíferos. "Acreditamos que o leite evoluiu como parte da função imunológica", disse ela.

Publicidade

 

Depois de comparar o genoma do gado com o de outras espécies de mamíferos, o grupo liderado pela pesquisadora concluiu que o leite é essencial para sobrevivência de mamíferos recém-nascidos e que os mecanismos de lactação têm mais de 160 milhões de anos. Uma série de artigos detalhando as descobertas feitas no genoma bovino deverá ser disponibilizada online no serviço BioMed Central.

 

(Ampliado às 17h39)

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.