Consumista, mas bem intencionado

Jovem brasileiro ainda não acredita no peso de suas ações, mas tem potencial para ser um consumidor consciente, segundo pesquisa divulgada pelo Instituto Akatu

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Por Agencia Estado
Atualização:

Apesar de interessado em desfrutar da natureza, o jovem brasileiro ainda não tem consciência do impacto de suas ações sobre o mundo e o meio ambiente, sobretudo quando escolhe suas roupas e alimentos. "Identificamos, porém, uma sensibilidade razoavelmente alta em relação a questões ambientais e sociais - quando verificamos que ele aponta a poluição e a distribuição de renda entre os problemas mundiais - somada a um desejo de consumir de forma mais consciente", comenta Hélio Mattar, presidente do Instituto Akatu para o Consumo Consciente, realizador da pesquisa. "Nosso objetivo, no instituto, é educar para o consumo consciente e verificamos, com esta pesquisa, existir um espaço para trabalhar". Além de conhecer os hábitos de consumo dos jovens, a intenção da pesquisa foi verificar sua percepção dos impactos destes hábitos sobre o meio ambiente e, a partir dos resultados, desenvolver programas para conscientizá-los sobre a importância do uso racional dos recursos naturais, como o que já existe em escolas públicas e privadas de São Paulo, Carapicuíba e Belo Horizonte (programa "Somos mais nós"). A mesma pesquisa foi aplicada em 24 países dos 5 continentes, entre julho e setembro de 2000, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e Programa das Nações Unidades para o Meio Ambiente (Pnuma). No Brasil, as entrevistas foram domiciliares, todas realizadas pela Indicador Opinião Pública, em novembro de 2001, com 259 jovens de 18 a 25 anos de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Belém, Recife, Salvador, Fortaleza, Brasília e Goiânia. Na análise comparativa do Brasil com as pesquisas Unesco/Pnuma, de outros países, utilizaram-se os resultados da Argentina, Austrália, Estados Unidos, França, Índia, Itália, Japão e México. Filhos pós-ditadura Os jovens brasileiros são definidos pelo Instituto Akatu, na apresentação da pesquisa, como filhos do período pós-ditadura militar, sucessores da chamada geração rebelde, hippies e pacifistas dos anos 60 e 70, tendo crescido num mundo marcado pelo fim da guerra fria e pela globalização econômica, sob a liderança dos Estados Unidos. No trabalho, têm de competir num mercado de trabalho estreitado pelo processo da globalização e pela reengenharia produtiva. E aparentemente preocupam-se somente consigo mesmos, sem se interessar por temas, que não lhe digam respeito diretamente. Um perfil de quem foi "curtido num longo período de carências, não só de empregos e alternativas profissionais, mas também de utopias e sonhos coletivos", como diz o texto. Para este tipo de jovem, os estudos e a carreira estão em primeiro lugar, entre as preocupações diárias (50% das respostas), seguido de perto pelo desfrute da natureza (49%) e música/dançar (45%) e sair com amigos (42%). Política e sociedade mobilizam só 10% deles, um índice bem inferior ao dos jovens japoneses (42%), argentinos (27%) e norte americanos (23%), mas semelhante aos jovens de outros países europeus e latino americanos, que se situa entre 18 e 11%. Desfrutar da natureza, ao contrário, é algo que interessa muito a 49% dos jovens brasileiros, um índice só superado pelos indianos (54%) e ligeiramente superior ao interesse dos mexicanos (44%), australianos (43%) e norte americanos (42%). Compras Em relação às compras, o jovem brasileiro aparece como o mais interessado (37%), superando mesmo os franceses (32%), japoneses (31%) e argentinos (28%), que estavam no topo do ranking internacional. O jovem interessado nos estudos, na natureza e nas compras ainda não acredita, porém, que suas ações têm impacto significativo no mundo (56%) e na cidade onde mora (51%). E uma parcela significativa (24%) não acredita nem mesmo influenciar a própria vida. Este sentimento de estar alijado de processos influentes fica ainda mais evidente nas respostas relativas à influência do trabalho que fazem em relação à sociedade, economia e meio ambiente: 59% dos jovens acham que seu trabalho não tem nenhuma influência sobre qualquer um destes. Na hora de viajar, eles parecem mais ou menos conscientes de que suas ações podem ter impactos ambientais (44%) ou econômicos (22%), mas uma parcela importante (31%) ainda acha que o modo de agir durante as viagens não altera nada. Na comparação com outros países, a consciência dos impactos ambientais durante as viagens é bem maior entre os argentinos (74%), italianos (60%), franceses (56%) e japoneses (54%) e equivalente entre indianos (46%) e mexicanos (45%). A escolha de roupas só afeta o meio ambiente para 10% dos jovens brasileiros; a compra de alimentos para 17% e o uso que fazem da energia só causa impactos ambientais para 29% deles. Já a maneira como o lixo é jogado fora têm implicações ambientais bem mais evidentes, para 84% dos entrevistados. E a maneira como usam a água fica num estágio intermediário, tendo influência sobre o meio ambiente para 44%. Os resultados desta primeira pesquisa serão posteriormente comparados pelo Instituto Akatu, com outras pesquisas já programadas. Uma delas, qualitativa, investigará mais a fundo hábitos e atitudes de consumo, e outra as motivações para mudar estes hábitos e atitudes. Tudo com a intenção de transformar este jovem consumista, mas com boas intenções, num consumidor de fato consciente.

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