Denis celebram a demarcação de suas terras

Parte da floresta, agora com o uso exclusivo garantido aos índios, tinha sido comprada por madeireira da Malásia

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Por Agencia Estado
Atualização:

Moradores de uma planície entre os rios Purus e Juruá, no estado do Amazonas, os índios denis estarão comemorando, amanhã, a conclusão da demarcação física de sua terra. São 1,5 milhão de hectares de floresta amazônica, onde vivem cerca de 700 pessoas. A garantia de uso exclusivo desse território ao povo Deni, no entanto, está sendo comemorada também pelos ambientalistas do Greenpeace que, em 1999, ao investigar a compra de 313 mil hectares de floresta pela madeireira malaia WTK, encontraram os índios e descobriram que boa parte das terras era, na verdade, território Deni. Desse encontro, surgiu uma parceria que levou os índios a se organizarem e fazerem a auto-demarcação de suas terras, agora oficializadas com a demarcação governamental, que termina neste mês. A celebração acontecerá na aldeia Boiador e contará com a presença de quatro, das oito aldeias denis. Entre os convidados, representantes de organizações não-governamentais, como o Conselho Indígena de Roraima (CIR) e o Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas (Inpa) e governamentais, como a Funai e a Fundação Estadual de Política Indigenista do Amazonas (Fepi). Para os índios, a demarcação significa a garantia da posse da terra, que ocupam há muitas gerações, assim como a manutenção de seu modo de vida, em estreita relação de dependência com a floresta e seus recursos naturais. Para um dos líderes denis, Bonarivi Deni, a festa marca o fim de uma etapa na qual os índios nunca deixaram de acreditar. ?A demarcação é bom para as crianças, que vão poder crescer e manter uma terra sabendo que é delas mesmo?, disse Bivuri Deni, outra liderança local. Greenpeace O Greenpeace se envolveu com a demarcação da Terra Indígena (TI) Deni quando, durante uma investigação de campo, descobriu que aproximadamente 150 mil hectares das terras compradas pela WTK se sobrepunham ao território dos índios. Confirmada a informação, Paulo Adário, coordenador da campanha da Amazônia da organização não-governamental, procurou os líderes denis, em maio de 1999. Lutando para superar as barreiras de comunicação, contou aos índios que parte de suas terras haviam sido vendidas para uma madeireira, que viria para derrubar as árvores. ?Os denis ficaram chocados. Depois de sofrer com doenças e mortes provocadas pelo contato com as frentes de colonização nos últimos 60 anos, não conseguiam entender como mais um problema poderia estar acontecendo. Afinal, a primeira vez que ouviram falar na demarcação de suas terras foi em 1985, quando os primeiros representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) chegaram para discutir com eles a questão?, disse Adário. Passado o susto, os denis pediram ajuda ao Greenpeace para proteger sua terra e conseguir a demarcação. A partir daí, a entidade ambientalista começou uma campanha internacional para que a WTK deixasse as terras denis e passou a acompanhar o trâmite do processo de identificação e demarcação da TI. O não-cumprimento dos prazos e acordos com a Funai fez com que os índios decidissem realizar eles mesmos a demarcação. Como não tinha experiência no assunto, o Greenpeace convidou o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a Operação Amazônia Nativa (Opan), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e a União das Nações Indígenas de Tefé (Uni-Tefé) para, juntos, formular um projeto que capacitasse os próprios denis a marcar os limites tradicionais de sua terra e, assim, comandar o processo demarcatório. Durante seis meses, uma equipe multidisciplinar trabalhou com líderes das oito aldeias denis para que aprendessem a manusear instrumentos como teodolitos, bússolas e GPS (equipamento de posicionamento por satélite). ?O sentimento dos denis sobre seu território ficou mais forte. Eles entenderam todas as etapas para realizar a demarcação, tanto física quanto legalmente, e porque ela é tão importante?, disse Nilo D?Ávila, coordenador do projeto de auto-demarcação Deni, do Greenpeace. No dia 11 de setembro de 2001, mesmo dia dos atentados terroristas nos Estados Unidos, os denis anunciavam o início do projeto de auto-demarcação e, um mês depois, foram recompensados com a edição de uma Portaria Demarcatória, assinada pelo Ministro da Justiça, garantindo reconhecimento constitucional dos direitos do povo Deni sobre seu território tradicional. Com isso, a Funai providenciou a licitação, vencida pela companhia Setag, para realização da demarcação oficial em campo. Esse trabalho, realizado após a auto-demarcação, teve início em maio deste ano e termina neste mês de agosto. Com a campanha junto ao mercado consumidor internacional, o Greenpeace conseguiu da WTK o compromisso de não explorar a área sobreposta à terra Deni e não entrar na Justiça contra o processo de demarcação. A subsidiária da madeireira em Manaus, a Amaplac, está desativada desde 2002. A celebração dos índios, marca um conquista importante, mas ainda não é o final do processo. O passo seguinte é a homologação da Terra Indígena Deni pelo presidente da República. No momento, existem 74 TIs, à espera de homologação. Leia o Especial Maioridade Ambiental

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