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Discreta campanha por sucessão papal começou antes de surpreendente anúncio

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Por Redação
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O papa Bento 16 pode ter surpreendido o mundo ao anunciar sua renúncia no domingo, mas alguns cardeais aparentemente já começaram há pelo menos dois anos suas manobras para a sucessão. As eleições para papa estão entre as mais misteriosas da história, sem candidatos declarados e com mais blefes do que num jogo de pôquer. Nenhum cardeal pode fazer campanha abertamente por um cargo cuja eleição seria inspirada pelo Espírito Santo. Mas, nos bastidores, em reuniões por detrás das espessas muralhas vaticanas e em jantares nos mais elegantes restaurantes de Roma, os cardeais-eleitores avaliam potenciais candidatos entre seus pares e lançam sutis sugestões a observadores da Santa Sé na mídia sobre quem está em alta ou em baixa. Essas rodadas de discretas discussões, apelidadas por romanos irreverentes como "totopapa" (algo como "loteria papal"), ganharam mais força desde segunda-feira, mas Bento 16 já havia dado o pontapé inicial ao declarar em 2010 a um entrevistador alemão que poderia renunciar se considerasse estar fisicamente incapacitado. "Essa confissão sacudiu a todos que são alguém no Vaticano, e levou alguns cardeais a se lançar à batalha semioficial", escreveu a jornalista francesa Caroline Pigozzi em seu recém-lançado livro "Le Vatican Indiscret". A abordagem dos cardeais é o contrário das campanhas eleitorais modernas, ao estilo norte-americano, com eleições primárias, debates pela TV, grandes doadores e estratégias para o Facebook e Twitter. "Paradoxalmente, não se deve aparecer nos jornais e certamente (não se deve) ser fotografado", escreveu ela. "Um homem da Igreja não é um astro, e deve sempre se lembrar do ditado que diz: ‘Quem entra papa no conclave sai cardeal'." John Travis, veterano correspondente em Roma e autor de um livro que sai no dia 21, "The Vatican Diaries", disse que concluiu suas obras às pressas, tendo em mente aquilo que o papa disse em 2010. "Eu temia que ele anunciasse sua renúncia antes de irmos para a gráfica", disse ele à Reuters. "Eu achava que ele faria isso em 22 de fevereiro, festividade do Trono de São Pedro, que é a festa associada à autoridade do papa." CONCLAVE EM MARÇO Cerca de um terço dos 117 cardeais aptos a votar trabalham na Cúria, a burocracia vaticana, e podem facilmente, em seus encontros, trocar impressões sobre estrelas em ascensão ou candidatos indesejados. Os outros, arcebispos espalhados pelo mundo, agora estão marcando seus voos para Roma e muitos pretendem estar presentes no adeus dos cardeais ao pontífice, em 28 de fevereiro. Uma vez em Roma, as conversas a meia voz começam para valer. O padre Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, confirmou nesta quarta-feira que o conclave começará em algum momento ainda indefinido a partir de 15 de março. Normalmente, quando um papa morre, os cardeais se dirigem para o funeral em Roma, realizado no nono dia depois da morte. Uma vez lá, as discretas interações por telefone e e-mail com colegas se tornam discussões cara a cara. O fato de não haver funeral desta vez, disse Lombardi, não significa que "os cardeais não cheguem a Roma, comecem a se reunir e conversar e a refletir sobre o estado da Igreja e sobres os critérios para a escolha de um sucessor". Citar candidatos abertamente é considerado falta de educação, mas muitos usam o educado recurso de discutir as qualidades que o novo papa deveria ter, deixando em entredito quem se encaixa nesse perfil. Antes do conclave, o Vaticano realiza reuniões plenárias chamadas congregações gerais, onde os cardeais discutem as questões que confrontam a Igreja e relatam as condições em seus países de origem. A data exata dessas reuniões tampouco foi fixada. Candidaturas não são debatidas nessas sessões, mas elas funcionam como plataformas nas quais aspirantes não-declarados atraem a atenção com seus discursos e encontram cardeais que ainda não conhecem.

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