Estrutura social dos gorilas é complexa e similar à das sociedades humanas

O estudo foi baseado em  dados coletados em dois sites de pesquisa distintos na República Democrática do Congo ao longo de quase vinte anos. Além da família imediata, existem indivíduos com quem são mantidas interações regulares

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Por Roberta Jansen
Atualização:

RIO - Os gorilas têm uma estrutura social mais complexa do que se imaginava e muito similar à das sociedades humanas, revela novo estudo. As descobertas sugerem que os nossos sistemas sociais remontam ao ancestral comum entre humanos e macacos e não teriam se originado do “cérebro social” dos hominídeos surgido depois de se separarem dos outros primatas.

Os gorilas vivem em pequenas unidades familiares, com um macho dominante, várias fêmeas e filhotes. Foto: REUTERS/Thomas Mukoya

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Publicado na Proceedings of the Royal Society B, o estudo foi baseado em  dados coletados em dois sites de pesquisa distintos na República Democrática do Congo ao longo de quase vinte anos, onde os cientistas documentaram centenas de trocas sociais entre os gorilas.

“Estudar a vida social dos gorilas não é fácil”, afirmou a principal autora do estudo, Robin Morrison, uma bioantropóloga da Universidade de Cambridge, em nota oficial sobre o estudo. “Os gorilas passam a maior parte do tempo em florestas densas, e pode levar anos até que se habituem à presença de humanos.”

Nas áreas alagadiças em que a vegetação é mais esparsa e se formam clarões na floresta, os gorilas costumam se reunir para se alimentar da vegetação aquática. Os pesquisadores instalaram plataformas de monitoramento nesses locais e, durante muitos anos, ficaram observando a vida dos gorilas desde o amanhecer até o por do sol.

Alguns dados coletados são do início dos anos 2000, mas a maior parte das informações vem das informações da clareira Mbeji Bai, onde cientistas trabalham há mais de vinte anos.

Os gorilas vivem em pequenas unidades familiares, com um macho dominante, várias fêmeas e filhotes. Alguns machos vivem isolados, como “solteirões”.

Morrison, que trabalhou em Mbeji, usou algoritmos para revelar padrões de interação entre grupos familiares e indivíduos.  Analisando a frequência e a duração dos “encontros”, ela descobriu várias camadas de relações sociais. 

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Além da família imediata, existem indivíduos com quem são mantidas interações regulares – um grupo de aproximadamente 13 gorilas. Nas sociedades humanas tradicionais, esse grupo poderia ser comparado ao da “família estendida”, ou seja, tios, avós, primos.

Para além desse grupo, há um outro que envolve, em média 40 gorilas, e que seria similar ao de agregados entre os humanos, gente que passa muito tempo junto sem necessariamente ter alguma relação de parentesco. “Fazendo uma analogia com os primeiros assentamentos humanos, seria como uma tribo ou pequeno assentamento, um vilarejo”, disse Morrison.

Quando os machos dominantes (os de costas prateadas) são aparentados, as chances de conviverem na mesma “tribo” é maior.  “Ao longo da vida, as fêmeas frequentam vários grupos ao mesmo tempo, o que torna possível que machos não aparentados cresçam nos mesmos ambientes, como se fossem irmãos postiços”, explicou Morrison. “E os laços que eles criam levam a essas associações que vemos quando estão adultos.”

Às vezes, explica a pesquisadora, quando os jovens machos deixam suas famílias originais, mas, ao mesmo tempo, ainda não estão preparados para formar o seu próprio núcleo familiar, eles formam grupos somente de machos solteiros. Soa familiar? Segundo os pesquisadores, esse também seria um período importante de fortalecimento dos laços.

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Os gorilas precisam andar quilômetros todos os dias para encontrar alimentos. De acordo com os pesquisadores, a cooperação é uma forma de tornar mais fácil essa jornada e criar uma espécie de memória coletiva para encontrar alimentos que são difíceis de localizar.

“Essa estrutura social que constatamos entre os gorilas provavelmente já estava presente entre os primatas antes de a nossa espécie divergir das demais; uma estrutura que se adapta muito bem ao modelo de evolução social humana”, explicou Morrison. “Nossas descobertas oferecem ainda mais indícios de que esses animais ameaçados são profundamente inteligentes e sofisticados e que nós, humanos, talvez não sejamos tão especiais quanto gostamos de acreditar.”

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