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Gás carbônico em rios amazônicos surpreende cientistas

O estudo identificou que, numa área da Amazônia com 1,77 milhão de quilômetros quadrados, tendo ao centro o encontro dos rios Solimões e Negro, há uma emissão para a atmosfera de 0,9 bilhão de toneladas de gás carbônico ao ano

Por Agencia Estado
Atualização:

Estudo divulgado nesta quarta-feira na revista Nature mostra que os rios da Amazônia são grandes fontes de emissão de gás carbônico para a atmosfera. Isso tem implicações para as políticas de preservação das florestas tropicais e até mesmo para que se ponha em prática o Protocolo de Kyoto. A dúvida agora é se esse CO2 vem dos próprios rios ou se há algum outro mecanismo envolvido. A pesquisadora Victoria M. Ballester, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura, em Piracicaba, São Paulo, assina o trabalho ao lado de Jeffrey E. Richey e Anthony H. Aufdenkampe, da Universidade de Washington, em Seattle, e John F. Melack e Laura L. Hess, da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara. "O estudo, baseado em dados coletados nos últimos dez anos, é uma contribuição para o entendimento do ciclo do carbono nas florestas tropicais", diz Victória. O estudo identificou que, numa área da Amazônia com 1,77 milhão de quilômetros quadrados, tendo ao centro o encontro dos rios Solimões e Negro, há uma emissão para a atmosfera de 0,9 bilhão de toneladas de gás carbônico ao ano. O estudo é importante para avaliar o papel das florestas tropicais, particularmente a amazônica, na absorção ou emissão de gás carbônico. A idéia predominante é que a Floresta Amazônica seja neutra (absorve tanto quanto emite) ou emissora de gás carbônico, por ser um bioma maduro, isto é, que já ultrapassou seu estágio inicial de formação, quando fixa grandes quantidades de carbono e água na matéria orgânica por meio da fotossíntese. Medições recentes, entretanto, realizadas pelo Large Biosphere Experiment on Amazon (LBA) - conduzido por universidades brasileiras, o INPE e a Nasa - mostraram que, quando se mede o fluxo de gás carbônico acima da superfície e ao longo da copa das árvores, a floresta se comporta como um absorvedor de gás carbônico da atmosfera. Essa absorção, no caso das florestas tropicais, seria equivalente ao carbono que elas perdem com o desmatamento, da ordem de 1,6 bilhão de toneladas por ano. O resultado surpreendeu os pesquisadores da área e, entre outros efeitos, aumentou a importância de estudos como o que tem a participação de Victoria. Entender o que acontece na interação entre a floresta e os rios passou a ser fundamental para explicar se, ao final, a floresta abosorve ou não carbono da atmosfera. "Acreditamos que avançamos na compreensão do problema. Se a floresta absorve carbono, mas não se observa aumento de biomassa nas pesquisas de campo, esse carbono tem de estar indo para algum lugar. Mostramos que boa parte dessa resposta está nos rios", relata Victoria. Dependendo dos resultados dessas pesquisas, há políticas nacionais e internacionais que podem carrear mais ou menos recursos para a proteção das florestas tropicais. Ninguém duvida de que vale a pena protegê-las por conta da diversidade biológica que abrigam, dos recursos hídricos que formam e do carbono que estocam nos troncos, folhas, raízes e matéria orgânica incorporada ao solo. Mas se, além disso, as florestas absorverem carbono, o interesse na sua conservação aumenta, particularmente por causa de seus efeitos sobre o clima no planeta. Mas o quadro ainda não está completo. A equipe que assina o artigo pretende agora dar atenção aos rios de menor porte, em que a interação entre floresta e rios é mais intensa. "Algumas das variáveis estão mais bem conhecidas, mas ainda falta aprofundar os estudos sobre os rios menores e suas várzeas", explica Victoria. Além da comunidade científica, com certeza os formuladores de políticas públicas e representantes de governos que negociam a implementação do acordo de Kyoto estarão atentos ao trabalho da equipe. Os países mais ricos, com exceção dos EUA sob a administração Bush, comprometeram-se a reduzir suas emissões de gás carbônico para a atmosfera, diminuindo o consumo de combustíveis fósseis. A eficácia desse acordo, porém, depende da comprovação de que as florestas tropicais, como a amazônica, sejam neutras ou emissoras moderadas de carbono.

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