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Hidrovias como eixo de desenvolvimento sustentável

Pesquisadores paulistas desenvolvem sistema integrado de gestão da água para modernizar o transporte fluvial.

Por Agencia Estado
Atualização:

Já é possível substituir o atual controle desarticulado das condições operacionais da hidrovia Tietê-Paraná por um sistema de gestão integrada, que considera fatores de segurança, ambiente, logística, meteorologia, hidrologia e ocupação da área de influência, disponibilizando as informações em tempo real. Está em fase final de validação, um projeto piloto do Sistema Integrado de Gestão do Uso Múltiplo das Águas (Sigest), montado na região do reservatório de Bariri, no interior de São Paulo, principal entroncamento intermodal do estado, onde os produtos agrícolas transportados por via fluvial, provenientes do Centro-Oeste brasileiro, são embarcados em trens ou caminhões com destino ao porto de Santos. Se estendido a toda a hidrovia Tietê-Paraná ? e a outras hidrovias planejadas no país - o sistema permitiria minimizar eventuais impactos ambientais, não só da operação de comboios de barcaças, como do uso das terras nas margens e zonas de influência da bacia hidrográfica. Além disso reduziria, em média, 20 a 30% dos custos por tonelada transportada, se comparado a rodovias, e 10 a 15%, em relação aos trens. ?De modo geral, um único comboio transporta o equivalente a 200 caminhões, com um motor que corresponde ao de 3 caminhões, portanto com um dispêndio de energia bem menor e emissões de poluentes significativamente mais baixos?, explica o engenheiro naval Carlos Padovezi, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT). Especializado na tecnologia das embarcações de carga, Padovezi hoje trabalha na adequação das barcaças aos indicadores ambientais dos rios. ?Há 50 anos atrás, as barcaças para transporte fluvial eram construídas com a mentalidade da engenharia naval marítima, que não lida com margens, assoreamento, trechos estreitos ou rasos. Isso implicava na adequação dos rios, com retificação, represamento, aprofundamento de calha etc?, observa. ?Atualmente já não há grandes obras ? o custo socioambiental e político é muito alto ? então o investimento em tecnologia se dá na adaptação do transporte às condições dos rios?. Recarga protegida A incorporação dessas tecnologias é apenas uma das faces do Sigest, cuja base de dados georreferenciados permite analisar, num ambiente virtual acessível via Internet, informações essenciais à navegação, como as condições de vento ou de vazão do rio para passagem sob pontes, em eclusas ou trechos difíceis. Tais informações estariam disponíveis tanto para o monitoramento de operações ou órgãos ligados à prevenção de acidentes, como para os pilotos das embarcações. ?E a meta é chegar ao nível de sistemas semelhantes, em operação na Europa, por exemplo, onde um investidor privado pode acompanhar o transporte de sua carga, do outro lado do mundo, planejando suas atividades com base em informações reais e atualizadas?, afirma Antônio Camargo, da Unesp, coordenador do Sigest. Os dados também servem de subsídio para políticas de ordenamento territorial, que incluem a definição de zonas adequadas à instalação de portos e distritos industriais ou armazéns agrícolas e a delimitação de zonas restritas, de preservação ambiental, essenciais à recarga de lençóis freáticos ou aqüiferos subterrâneos. Uma das cartas do Sigest no projeto piloto mostra, por exemplo, a zona de recarga do Aqüifero Guarani, que naquela região está entre 100 e 200 metros de profundidade. ?Trata-se de uma zona rural, que deveria estar sujeita a um controle, de modo a não ser transformada em cidade, distrito industrial, mineração. Também se deveria evitar a aplicação de pesticidas e a instalação de pocilgas ou currais, todos usos incompatíveis com uma área de recarga, pela possibilidade de contaminar o aqüifero?, observa Camargo. Navegabilidade e desenvolvimento Iniciado em dezembro de 2001, o projeto piloto do Sigest recebeu R$300 mil do Fundo Setorial de Recursos Hídricos, gerenciados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e uma contrapartida de R$600 mil das instituições parceiras na pesquisa. Ainda deve receber mais R$ 101 mil até sua conclusão, em 2004. O trabalho envolveu uma equipe multidisciplinar de pelo menos 40 pesquisadores, engenheiros e técnicos, do IPT, da Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), Universidade Estadual Paulista (Unesp) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), contando ainda com a colaboração de órgãos ambientais estaduais, como a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) e o Instituto Florestal (IF). Um dos primeiros sub-produtos do sistema, que sai do nível experimental para o operacional, é a montagem de um centro de controle para o Departamento Hidroviário da Secretaria Estadual de Transportes (DH-Sectrans), em parceria com a Poli-USP. ?A gestão integrada do uso múltiplo das águas interiores é importantíssima, porque concilia as necessidades de energia, transporte, irrigação, abastecimento e ambiente. Somos os maiores interessados em preservar os rios, porque do contrário não poderíamos garantir sua navegabilidade?, afirma Oswaldo Rosseto, diretor do DH, que administra 2.400km de rotas navegáveis no estado. ?Um sistema como o Sigest permite aos tomadores de decisões atuar na região de influência de uma hidrovia de forma pró-ativa e não reativa, como atualmente?, acrescenta Camargo. ?Não vemos as hidrovias apenas como estradas de água, mas como eixos de desenvolvimento sustentável, como uma maneira competente e racional de planejar a ocupação das margens, incluindo restrições de uso em áreas que devem ser protegidas?.

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