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Levi-Strauss destaca importância do período em que viveu no Brasil

Por Agencia Estado
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"O Brasil representa a experiência mais importante da minha vida", afirmou o etnólogo Claude Levi-Strauss, um dos mais importantes intelectuais franceses do século XX, às vésperas do início do Ano do Brasil na França. Em entrevista ao jornal "Le Monde", o autor de "Tristes Trópicos" (1955) assinala que sente "uma dívida muito profunda" com o Brasil, aonde chegou em 1935, aos 27 anos, para ensinar sociologia em São Paulo, e estudou as sociedades primitivas amazônicas, como os índios Bororos, Caduveos ou Nambikwaras. Essa experiência, de quatro anos, serviria de base à construção teórica da antropologia estrutural de Levi-Strauss, que aos 96 anos decidiu romper seu silêncio midiático por causa do Ano do Brasil na França, que começará em março. "O Brasil representa a experiência mais importante da minha vida, que teve um papel determinante na minha carreira", explica o etnólogo, que após ir embora em 1939 só voltou uma vez, em 1985, para acompanhar o então presidente da França, François Mitterrand, na sua visita de Estado de cinco dias. "Embora muito curta, essa estadia produziu em mim uma verdadeira revolução mental: o Brasil tinha se transformado em outro país", assinala Levi-Strauss, que evoca "a civilização em escala mundial". A cidade de São Paulo tinha passado de um milhão de habitantes para mais de 10 milhões, onde tinham desaparecido os rastros da época colonial, uma cidade "rodeada de quilômetros de torres", lembra. Levi-Strauss acrescenta que já nos anos 30 do século passado podia se observar no Brasil o fenômeno da formação acelerada das cidades. Depois de observar que o vínculo entre o homem e a natureza "talvez tenha se rompido", assinala que "se pode entender que o Brasil, que se desenvolveu de forma tão considerável, tenha para a natureza a mesma política que a Europa na Idade Média, ou seja, destruí-la para instalar uma agricultura". Em 1985, só pôde sobrevoar o território amazônico dos índios Bororos: "pudemos ver algumas aldeias com sua estrutura circular ainda, mas dotadas de pistas de aterrissagem". O antropólogo denuncia que os povos indígenas da Amazônia foram "mais ou menos exterminados", ao afirmar que só sobrevive "entre 5 e 10% da população original", mas destaca que alcançaram contato uns com os outros e "sabem agora o que ignoraram durante muito tempo: já não estão sozinhos no Universo". Portanto, comenta, a etnologia "nunca mais será" a mesma que praticou, e "agora estamos em um regime de ´compenetração mútua´. Vamos para uma civilização em nível mundial" onde "provavelmente" aparecerão diferenças, mas não da mesma natureza, "serão internas, e já não externas". Perguntado sobre o futuro, Levi-Strauss responde que "estamos em um mundo ao qual já não pertenço". "O que eu conhecia e amava tinha 1,5 bilhão de habitantes. O mundo atual tem 6 bilhões. Já não é o meu. E o de amanhã, povoado de 9 bilhões de homens e mulheres (...) me impede de fazer qualquer prognóstico", conclui o intelectual francês.

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