"Não temos tempo a perder", adverte Gro Brundtland

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Por Agencia Estado
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O conceito de desenvolvimento sustentável tornou-se universalmente conhecido e, ao menos teoricamente, aceito no fim da década de 80. A idéia foi exposta no documento Nosso Futuro Comum, elaborado por uma comissão da Organização das Nações Unidas (ONU), que acabou ditando a pauta da Eco 92, encontro que discutiu o futuro da humanidade sob uma perspectiva ambientalista, no Rio, em 1992. Na presidência da comissão estava a médica Gro Harlem Brundtland, então primeira-ministra da Noruega - cargo que assumiu aos 41 anos. Gro já tinha se firmado como "a mãe" do desenvolvimento sustentável quando se tornou diretora-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1998. Antes de embarcar para o Brasil, onde entrega nesta quarta-feira o prêmio ECO 2005, concedido pela Câmara Americana de Comércio a empresas comprometidas com o desenvolvimento sustentável, ela falou ao Estado. Estado - Como definir desenvolvimento sustentável? Gro Harlem Brundtland - É atender às necessidades das pessoas sem comprometer as futuras gerações. Pela primeira vez na história, uma geração, no caso a minha, teve de encarar que o que estamos fazendo terá conseqüências desastrosas. Antes os estragos não eram tão comprometedores. Estado - Por que o conceito foi considerado tão revolucionário nos anos 80? Gro - A noção de desenvolvimento sustentável já tinha sido usada antes por cientistas na área de conservação da natureza. As pessoas não estavam acostumadas a pensar no meio ambiente dentro de uma perspectiva econômica. Nós demonstramos serem necessárias mudanças políticas, socais, industriais, de negócios, de produção e gasto de energia, para impedir que a degradação do ambiente leve a um risco da sobrevivência da humanidade. Essa abrangência era revolucionária. Estado - Quase 20 anos depois, quais foram os avanços? Gro - Tivemos acordos internacionais, por exemplo, em relação aos gases do buraco de ozônio e aos oceanos. Isso reverteu o risco que existia. O Protocolo de Kyoto é fundamental mas não foi acatado por todos. Estado - Da Eco 92 saiu um documento de intenções chamado Agenda 21. Pouco do que está lá foi respeitado. Por quê? Gro - Não houve avanços na extensão que pretendíamos. A maioria dos países concordou com o que foi proposto. Mas, depois da Eco 92, a ajuda financeira para projetos de desenvolvimento sustentável diminuiu. Acho que por falta de sensatez. Nos últimos cinco anos, começou a haver mais dinheiro para os países pobres, mas ele foi mais focado em saúde e educação. São aspectos importantes, mesmo da Agenda 21, que trata de desenvolvimento, da necessidade de preparar os países pobres para que eles consigam sair da pobreza. Mas o meio ambiente não foi cuidado como merecia. Estado - No Brasil, há muitos projetos isolados de desenvolvimento sustentável, mas, embora seja uma bandeira do governo, ele não se transformou em política nacional. Por que é tão difícil? Gro - O conceito é político e social. É preciso mudar a política energética, a política industrial, mudar as regras do transporte para evitar poluição... É preciso mudar em todas as áreas. Não é fácil, porque é preciso decisão política, do governo, dos parlamentos, da sociedade. Em países pobres, é mais difícil porque o ganho a curto prazo parece mais importante. Estado - A sra. teme uma pandemia de gripe aviária ou acha que há muito pânico a respeito? Gro - Não acho que existe pânico, não. Acho que é preciso no momento preparação e cooperação entre os países. Temos de estar preparados para identificar a pandemia, supervisionar o andamento dela, pois há um risco considerável. Se acontecer, muita gente vai ficar doente, muitas pessoas devem morrer. Portanto, o risco tem de ser levado muito a sério. Estado - A sra. sempre disse que seu objetivo maior era proteger o futuro das próximas gerações. Elas estão seguras? Gro - Não. Os estragos causados ao meio ambiente continuam indo na direção errada. A gente não tem mais muito tempo a perder. Temos de reverter o quadro o quanto antes.

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