Pesquisadores identificam composto com potencial para tratamento da malária

Testes apontam que molécula é capaz de atacar a infecção no paciente e impedir a propagação do parasita

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Por Camila Boehm
Atualização:

SÃO PAULO - Um grupo internacional de pesquisadores identificou um composto capaz de interromper o ciclo de vida do parasita causador da malária no corpo humano, impedindo a transmissão da doença para o mosquito vetor. Os resultados do estudo abrem caminho para que um novo medicamento contra a doença seja desenvolvido. O trabalho teve a participação de brasileiros, financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de São Paulo (Fapesp).

A malária é transmitida pela picada do mosquito anopheles infectado pelo plasmódio Foto: REUTERS/Jim Gathany/CDC/via Reuters

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A molécula denominada TCMDC-135051, sintetizada pela empresa farmacêutica GSK, conseguiu inibir uma proteína essencial para o ciclo de vida de três espécies de parasitas causadores da malária, duas delas em circulação no Brasil. Mesmo o mais agressivo dos parasitas, o Plasmodium falciparum, mostrou-se sensível ao composto.

A malária é uma doença infecciosa febril aguda, causada por parasitas do gênero Plasmodium, transmitidos pela picada da fêmea infectada do mosquito Anopheles. O paciente com malária não é capaz de transmitir a doença diretamente para outra pessoa, sendo necessária a participação do mosquito.

A ação do composto testado na pesquisa afeta o parasita em diferentes estágios de desenvolvimento, o que o torna mais eficiente. A substância tem eficácia tanto na fase assexuada do parasita, quando ele se prolifera dentro da célula humana e provoca os sintomas, quanto na fase sexuada - quando pode ser transmitido de volta para o inseto vetor, recomeçando o ciclo, podendo risco de infectar outras pessoas.

Testes sugerem eficácia

Os testes foram realizados com cultura de células in vitro e em animais. “In vitro mostrou a inibição da enzima, que o parasita morria dentro da célula, e in vivo mostrou a eliminação do parasita circulante no camundongo”, disse Paulo Godoi, que realizou o trabalho de pesquisa no Centro de Química Medicinal (CQMED), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O resultado in vivo mostrou ainda a eliminação do parasita na corrente sanguínea após cinco dias de infecção.

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O pesquisador explicou que há uma diferença importante entre a ação desse novo composto e dos medicamentos que já estão no mercado. “Essa molécula nova é bastante específica para eliminar o parasita sem, provavelmente, interferir em outras proteínas do corpo. Isso já é uma boa indicação de que efeitos colaterais no ser humano, se ocorrerem, devem ser pequenos”, disse.

“A gente testou concentrações bem altas do composto contra a proteína humana e não viu qualquer tipo de interação entre as duas. Então, isso é uma boa indicação”, acrescentou. Para ser considerada segura, uma molécula candidata a se tornar um medicamento não pode ter interferência com proteínas humanas.

Falta de interesse é desafio

De acordo com dados do ano passado, mais de 190 mil casos de pessoas infectadas pela malária foram documentados no Brasil, a grande maioria na região amazônica. “O número de pessoas infectadas é bastante grande, mas a indústria farmacêutica mundial tem pouco interesse nesse tipo de doença, porque ocorrem mais em países pobres e as doenças não são crônicas”, disse Paulo Godoi. E acrescentou: “A indústria tem muito interesse por doenças crônicas, nas quais o paciente tem que continuar tomando a medicação por muitos anos.”

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Além da falta de interesse da indústria farmacêutica, outra barreira para a erradicação da malária é que o parasita tem adquirido resistência aos medicamentos existentes.

“Dado o número de casos no Brasil e em outras partes do mundo, acho que é interessante a gente trabalhar com uma droga nova, também porque as drogas atuais não estão mais funcionando muito bem, os organismos dos parasitas estão se tornando mais resistentes a essas drogas e, por isso, fica mais difícil tratar as pessoas que forem infectadas.”

O grupo de pesquisadores que realizou os testes integra a rede do Structural Genomics Consortium (SGC) – consórcio internacional de universidades, governos e indústrias farmacêuticas para acelerar o desenvolvimento de novos medicamentos.

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