Pioneiros não têm do que reclamar

Após alguns anos de uso, imóveis ecológicos se provam mais confortáveis e econômicos.

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Por Agencia Estado
Atualização:

Construir um imóvel seguindo os princípios do desenvolvimento sustentável, em plena cidade de São Paulo, e usufruir de seus benefícios, não é utopia, mas realidade na vida do casal de arquitetos Marcelo e Marta Aflalo e dos alunos e funcionários da Escola Viva. São dois casos onde as dificuldades iniciais, motivadas pelo pioneirismo de projetar, procurar matérias-primas adequadas e realizar construções com o mínimo impacto ambiental, foram compensadas pelo conforto e economia alcançados, além da sensação de dever cumprido. Inaugurado no início de 2001, o prédio da Escola Viva, na zona sul de São Paulo, foi pensado desde o início para ser totalmente ecológico. A principal motivação da proprietária, Célia Tilkian, era mostrar na prática a teoria que sempre trabalhou com seus alunos. Construído totalmente em madeira de reflorestamento certificado - inclusive os pilares, que são toras de eucalipto -, o prédio de dois andares foi pensado também para ter ventilação e iluminação adequadas nas salas de aula, e dispensar ao máximo a utilização de refrigeração e iluminação artificiais. Por conta disso, todas as salas contam com janelas dos dois lados. Além disso, a escola possui um sistema de captação da água de chuva, que recebe um pequeno tratamento, e é utilizada nas descargas dos banheiros, na lavagem do pátio e para regar o jardim. Todos os banheiros contam com descargas de baixo consumo de água e as torneiras são de tempo controlado. O telhado é feito de embalagens PET recicladas, material utilizado também nas mesas e cadeiras do refeitório. O chão do pátio externo é de tijolos de barro, sem rejunte, o que permite a infiltração rápida da água, evitando a formação de poças. O mesmo princípio da construção é levado também para o mobiliário - de madeira certificada -, a coleta seletiva do lixo e o uniforme escolar, confeccionado com tecido de PET reciclado. Célia garante que não gastou mais na obra do que em uma construção convencional e hoje economiza nas contas de água e energia e também na manutenção do prédio. ?Não tenho dúvidas de que a experiência foi boa em todos os aspectos, mas principalmente no exemplo de responsabilidade social, que demos para nosso alunos, mostrando que é possível ter produtos bons, bonitos e baratos a partir de materiais reciclados ou de baixo impacto ambiental?, disse. Respeitando o terreno Quando resolveram construir sua casa, em um terreno muito íngreme na zona sul de São Paulo, os arquitetos Marcelo e Marta Aflalo não quiseram se render às construções tradicionais, de concreto e metal, a partir de cortes no terreno. ?Muros de arrimo sempre caem, pois não respeitam a natureza, onde a água cai e infiltra no solo?. O aprendizado sobre uma obra sustentável foi sendo desenvolvido durante o processo de construção e valeu a pena, segundo o casal, que vive no imóvel desde 1999. Também construída em madeira de reflorestamento, a casa fica suspensa do solo em seis pilares de concreto, onde a própria terra serviu de forma, praticamente sem interferência no terreno e mantendo quase toda a vegetação natural. A madeira escolhida foi um tipo de eucalipto, produzido através de manejo sustentado pela Klabin no Paraná, resistente a fungos e bichos. Toda a madeira comprada foi integralmente aproveitada na estrutura, pisos, forros, escadas, portas, janelas e parte do mobiliário da casa, de 250 m2. ?O mesmo lote de madeira teve aproveitamentos diferentes. A madeira que usei para construir minha casa é a mesma quantidade jogada fora em uma construção convencional, que usa madeira como forma para o concreto?, disse Marcelo. Segundo o arquiteto, o projeto privilegiou ainda a iluminação natural e a ventilação, que segue o princípio da chaminé, onde abrindo as janelas mais baixas, o ar quente sobe e sai pelas janelas altas. O teto é uma manta vinílica (um emborrachado com sílica), considerado um ótimo isolante, que foi esticado e colado no forro de madeira. As paredes externas e algumas internas foram revestidas por painéis de concreto celular (um tipo de espuma de concreto muito leve), que protege a madeira do sol e da chuva, dando durabilidade à madeira. O projeto original previa também painéis de energia solar que, segundo Aflalo, podem ser colocados a qualquer momento. ?Tive dificuldades para explicar o projeto para os agentes financiadores e para a prefeitura, mas consegui aprovar e serviu de precedente. A construção sai mais barata do que uma casa normal e produz uma grande sensação de bem-estar em seu interior, pelo efeito da luz com a madeira, além de ter ganho vários prêmios. No entanto, nunca tivemos uma consulta séria de clientes para fazer outra no mesmo princípio, pois ainda é um conceito novo no Brasil. Na hora H, o preconceito fala mais alto e prevalece o mito dos três porquinhos, de que concreto é mais seguro e durável?, ironiza.

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