Reprodução em cativeiro pode salvar atum

O atum caminha rapidamente para a lista das espécies ameaçadas de extinção. A razão é a sobrepesca, principalmente por navios-fábrica japoneses, taiuaneses e chineses

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Por Agencia Estado
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O anúncio, feito por pesquisadores japoneses no início de julho, de que tiveram sucesso na fertilização natural de atuns nascidos em cativeiro, é uma esperança ao manejo sustentável dos recursos marinhos. O atum caminha rapidamente para a lista das espécies ameaçadas de extinção. A razão é a sobrepesca, principalmente por navios-fábrica japoneses, taiuaneses e chineses. Estatísticas da FAO, órgão da ONU para a agricultura e alimentação, mostram que a frota pesqueira desses três países, mais a da Espanha, responde por 80% da captura dos diferentes tipos de atum em todo mundo. Em 2000, foram mais de 430 mil toneladas só do tipo mais consumido, o "bigeye tuna" ou Thunnus obesus. Mas a sobrepesca é impulsionada pela demanda dos consumidores, principalmente asiáticos. No mercado de Tóquio, onde esse peixe alcança os preços mais altos, um espécime gigante, com 550 quilos e 3 metros de comprimento, custa mais de US$ 50,000. Os atuns grandes, de mais de 50 quilos, custam cerca de US$ 90 o quilo. Esse preço reflete a sua importância na culinária. "É impensável um sushi ou sashimi sem atum" resume Severino Macedo, cearense e sushiman- chefe em um restaurante de São Paulo que serve mais de uma tonelada por ano só de atum e salmão. "O custo desses pratos é dado pelo atum, em qualquer parte do mundo", explica. Persistência Do outro lado do mundo, Yoshifumi Sawada, pesquisador da Universidade de Kinki, a 450 quilômetros de Tóquio, que conseguiu a reprodução em cativeiro, fala entusiasmado da importância do resultado obtido. "Isto significa não só que poderemos consumir o atum sem esgotar os limitados recursos naturais, mas também que talvez possamos algum dia reestocar os oceanos soltando os peixes que criamos." Embora atuns capturados muito jovens em mar aberto estejam sendo engordados em cativeiro no México, Austrália e Japão, nunca se havia conseguido a completa reprodução desse peixe em cativeiro, ou seja, fazer com que peixes nascidos em cativeiro tivessem uma prole com sucesso. As dificuldades são várias. A começar pelo desconhecimento dos seus hábitos. "Não sabemos como ele cresce e se reproduz quando livre" explica Sawada ao justificar 30 anos de pesquisas com base em tentativa e erro. Mas o seu esforço parece ter sido recompensado. O pesquisador conseguiu perto de 240 mil alevinos, dos quais uma boa parte, acredita, vai chegar à vida adulta. Falta de fundos Os experimentos começaram em 1970, com a captura de alguns espécimes jovens que estariam sexualmente maduros daí a cinco anos. Foi só em 1979 que se conseguiu a primeira fertilização, mas todos os filhotes morreram nos meses seguintes. O mesmo ocorreu pelos anos seguintes. O pior período foi de 1982 a 1994, quando não se obteve uma única fertilização, levando toda equipe de pesquisa literalmente ao desespero. Segundo Sawada, isso foi o resultado da combinação da ignorância dos hábitos sexuais do atum com flutuações naturais na temperatura e salinidade da água do mar. Mas as dificuldades vinham também da falta de verbas. Para contornar a situação, os pesquisadores engordavam outras espécies de peixe para vender no mercado, fazendo caixa para o projeto. Depois de cinco anos de penúria, 20 filhotes de atum nascidos em cativeiro entre 1995 e 1996 chegaram finalmente à maturidade sexual. Parte desses peixes é que se reproduziu entre o final de junho e o início deste mês. "Ficamos todos extremamente felizes", conta Sawada, sem conseguir romper a tradicional fleuma nipônica. Em resposta ao sucesso do projeto, o governo japonês já garantiu US$ 830 mil para os próximos cinco anos. A tarefa agora é criar os filhotes até a maturidade e reproduzi-los em cativeiro. Trabalho que Sawada chama de "domesticação", comparando o que foi feito, no passado, com cavalos e cachorros. A equipe do projeto não divulgou ainda os dados técnicos do experimento de sucesso. Não é provável que o faça tão cedo. As cifras envolvidas, só no comércio atacadista de atuns, é de dezenas de bilhões de dólares por ano. De qualquer maneira, do sucesso desse novo negócio depende a sustentabilidade de boa parte dos oceanos. Que seja muito lucrativo. São os votos da vida marinha.

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