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Reversão do desmatamento da Amazônia é tarefa de todos os ministérios

De acordo com a ministra Marina Silva, governo vai enfrentar de forma solidária o desafio de reverter a degradação ambiental da Amazônia

Por Agencia Estado
Atualização:

O vazamento dos números do desmatamento da Amazônia, pela Agência Estado, apressou uma série de reuniões de governo, envolvendo sobretudo o Ministério do Meio Ambiente (MMA), para explicar o aumento vertiginoso dos índices. O desmatamento saltou de um patamar de 18 mil km2, registrados nos últimos 5 anos, para os 25.500 km2 de 2002. ?Desde o início de junho já sabíamos que os dados seriam preocupantes e vínhamos trabalhando nas propostas de controle?, diz a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. ?O grande diferencial, este ano, é que o esforço é solidário, é um processo conduzido pela Casa Civil, com o envolvimento de vários ministérios, como Transportes, Agricultura, Integração, Reforma Agrária, além de Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente. Não no sentido de dividir o prejuízo, mas de dividir o desafio de reverter a situação?. De acordo com a ministra, a primeira providência foi dar publicidade aos dados para que diversas instituições de pesquisas, relacionadas à Amazônia, e organizações não governamentais sociais e ambientais, pudessem analisar as informações e contribuir com sugestões. ?Queremos saber o que é desmatamento legal, o que é ilegal, quais as áreas mais críticas, quais as novas frentes, quais os desmatamentos em frentes de ocupação consolidadas?, diz. As análises e sugestões serão discutidas na próxima segunda feira, em Brasília, e levadas para a reunião interministerial, de onde sairá um plano de ações emergenciais e políticas mais permanentes. ?Sabemos que este processo de desmatamento é como um carro em alta velocidade: não vai ser contido facilmente. Além disso, queremos fugir do campo da pirotecnia, propondo políticas consistentes, que tragam resultados?, afirma. A ministra acredita na possibilidade de ?conversão? de outros ministros, diante da gravidade da degradação ambiental. A única medida concreta que ela pode adiantar, no entanto, foi a decisão de passar o monitoramento para uma base mensal, de forma que as tendências possam ser acompanhadas mais de perto, a tempo de se trabalhar com prevenção e não só ?apagando incêndios?. Cobranças Entre os ambientalistas e pesquisadores, os 25.500 km2 desmatados em 2002, provocaram fortes reações. O tom geral foi de cobrança de uma postura mais enérgica do MMA e da fiscalização do Ibama. ?Boas intenções capitaneadas por um ministério de baixo orçamento, como o MMA, não bastam?, argumenta Paulo Adário, coordenador da campanha da Amazônia do Greenpeace. ?Não custa lembrar que o ministro José Sarney Filho foi incensado pelas organizações não-governamentais (ongs) durante o segundo governo Fernando Henrique Cardoso por suas medidas contra o desmatamento e pela canalização de recursos internacionais do Programa Piloto de Florestas ? o PPG7 - para programas de desenvolvimento sustentável, combate a queimadas. Essas medidas, no entanto, apenas mitigaram o problema sem atingir as verdadeiras causas econômicas e sociais da destruição da Amazônia, tais como a expansão da agricultura e da pecuária, as queimadas fora de controle, o avanço descontrolado da exploração ilegal de madeira, a abertura de estradas, os assentamentos do Incra em áreas de floresta, as invasões estimuladas ou expontâneas?. Para o coordenador do Greenpeace, parte da explicação para o aumento surpreendente do desmatamento está na ampliação da área plantada na região, no boom do gado, da soja e do arroz. ?Também pesa a desvalorização do real no início de 2001, a maior competitividade da madeira abatida impunemente na região, a inexistência de crédito para manejo sustentável dos recursos florestais e a crônica incapacidade de implementação de órgãos governamentais - como o Ibama ? fragilizados por anos de sucateamento orçamentário?. Cláudio Pádua, diretor científico do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) e consultor do Projeto Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA), lembra a importância da Amazônia para a preservação da biodiversidade e para o clima mundial e considera ?inconcebível que o desmatamento atinja estes índices?. Ele admite que parte das derrubadas podem ser legais, ?mas com estas proporções, só podemos dizer que a Amazônia continua sendo ocupada como de costume, ou seja, de forma irresponsável. O governo brasileiro precisa tomar pé da situação?. ?Os novos números comprovam, que as medidas e políticas adotadas até agora não funcionaram, portanto esta é uma ocasião para o governo mudar de política?, comenta Evaristo Eduardo de Miranda, coordenador de pesquisa da Embrapa Monitoramento por Satélite. Segundo ele, não existe desmatamento na Amazônia, mas desmatamentos. ?A Amazônia é uma região complexa e os desmatamentos estão relacionados a causas tão diferentes como o simples crescimento vegetativo da população nas pequenas propriedades; a expansão do café; vários tipos de pecuária; ao reagrupamento de propriedades; a pólos madeireiros associados a invasões de terras e projetos de assentamento; à implantação de novas culturas como a soja; à intensificação do algodão, milho e arroz, etc?, diz. Para ele, ainda falta analisar a fundo não só as causas, mas principalmente, as tendências futuras de cada região e cada atividade, as tendências de mudanças no uso das terras. ?Se o desmatamento cabe num numero só, as políticas não cabem, elas precisam ser aprofundadas?, diz Miranda. Já Rosa Lemos de Sá, superintendente de conservação do WWF-Brasil, optou por divulgar algumas sugestões, priorizando a implementação de políticas públicas para frear a conversão da Floresta Amazônica em áreas de ocupação desordenada e exploração econômica temporária. As medidas recomendadas são: 1. Completar o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) nos estados da Amazônia, pois só o planejamento do uso do território poderá impedir que a ocupação e a expansão da atividade econômica aconteçam de forma ordenada e com base em critérios técnicos e científicos que levem em conta as características biogeográficas, a biodiversidade, a potencialidade econômica e a cultura da região. 2. Adotar um programa de agricultura sustentável em terras já desmatadas ou degradadas (principalmente pelo cultivo extensivo da soja). 3. Apressar a criação e implementação de parques e reservas sob proteção federal ou estadual (unidades de conservação), de forma a criar uma barreira junto ao arco do desmatamento, evitando que o mesmo se amplie, como previsto no Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA), realizado pelo MMA em parceria com o WWF-Brasil. 4. Criar florestas nacionais para a produção sustentável de madeira e de outros recursos florestais, no regime de licitação pública por um prazo adequado e conforme os padrões de certificação do FSC (Forest Stewardship Council ou Conselho de Manejo Florestal). 5. Incentivar a legalidade e sustentabilidade do setor florestal por meio de incentivos, financiamentos e reduções de alíquotas equivalentes aos destinados à atividade agropecuária e da promoção de uma economia de base florestal na Amazônia.

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