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Testes rápidos reduzem casos de sífilis congênita

Pesquisa motivou adoção de exames durante pré-natal no SUS

Por Alexandre Gonçalves
Atualização:

 Testes rápidos para sífilis são eficazes na diminuição dos casos de sífilis congênita, especialmente nas regiões mais pobres do planeta. É o que mostra um estudo realizado em seis diferentes países, entre eles o Brasil. No País, a pesquisa já deu frutos. Restrita às comunidades indígenas do Amazonas e de Roraima, ela inspirou uma decisão de âmbito nacional: a incorporação dos testes rápidos de sífilis e HIV ao pré-natal do Sistema Único de Saúde (SUS), no fim do ano passado. Todos os anos, a sífilis na gravidez é responsável por 500 mil abortos espontâneos e partos de natimortos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula que dois milhões de gestantes convivem com a doença. Metade transmite sífilis aos filhos. Além do risco de morte, nos bebês infectados, também é maior a prevalência de prematuridade, baixo peso ao nascer e outros problemas congênitos. "É revoltante. A sífilis é muito fácil de tratar com antibiótico: bastaria diagnosticar", afirma a ginecologista Adele Benzaken, que coordenou o estudo no Brasil. À época, ela trabalhava na Fundação Alfredo da Matta, em Manaus. Adele explica que não bastava mostrar que os testes funcionam quando são aplicados pelos pesquisadores. Era preciso provar que, nas precárias condições que marcam a atuação dos agentes de saúde nos confins da Amazônia, os testes seriam capazes de salvar vidas. "A Fundação Bill e Melinda Gates (que financiou o estudo) não queria uma pesquisa teórica. Queria resultados que virassem políticas públicas", afirma Adele, que hoje trabalha no escritório do Programa das Nações Unidas para DST/aids (Unaids), em Brasília. Outros cinco países participaram da pesquisa - China, Peru, Zâmbia, Uganda e Tanzânia -, que foi coordenada por pesquisadores da London School of Hygiene and Tropical Medicine, na Inglaterra. O Brasil recebeu US$ 1,5 milhão do financiamento de US$ 9,2 milhões da Fundação Bill e Melinda Gates. O artigo com os resultados mereceu publicação na revista PLoS Medicine. Na primeira fase da pesquisa, de 2002 a 2008, Adele ajudou a validar os testes rápidos disponíveis no mercado brasileiro. As pessoas que procuravam o serviço de saúde faziam o exame rápido e o convencional. Desta forma, os cientistas comparavam os resultados e puderam concluir que o método rápido, do ponto de vista técnico, oferecia resultados semelhantes ao do método convencional. Nos anos seguintes, o grupo tentou provar a eficácia dos testes em um cenário real, em que os exames são aplicados por agentes de saúde. Escolheram as comunidades indígenas do Amazonas e de Roraima para realizar o estudo. Em parceria com a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e com o Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde,  treinaram os profissionais que atuam nas aldeias para realizar os testes rápidos de sífilis. Decidiram realizar testes de HIV também. Ao todo, 45.971 índigenas com mais de 10 anos foram testados. Cerca de 1,6% tinha sífilis, incluindo 64 mulheres grávidas. O porcentual é semelhante ao observado na população brasileira. Entre os ianomâmis, a doença estava quase ausente. Mas, em aldeias do Alto Solimões e do Vale do Javari, a situação era péssima, com prevalências de 2,2% e 5%, respectivamente. "Há uma diferença grande entre as regiões", explica Adele. "Como são comunidades fechadas, enquanto a doença não chega, não há práticamente casos registrados. Mas, depois, ela se espalha com facilidade." Para Adele, a "enorme brecha" que costuma existir entre pesquisas e ações concretas foi superada porque, desde o início, o estudo incluía uma cooperação com o poder público. Ela conta que o projeto criou um método próprio para controlar a qualidade do trabalho dos agentes de saúde: eles recebiam ampolas com amostras para testar. (Os cientistas sabiam de antemão qual deveria ser o resultado para cada amostra.) Se um agente de saúde errasse o diagnóstico, os pesquisadores analisavam a causa do erro. As hipóteses incluíam a má iluminação do local de trabalho ou a necessidade de mais treinamento. A estratégia também inspirou outros programas governamentais.

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