Tratamento contra câncer ganha novo enfoque

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Por Agencia Estado
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Você já ouviu, leu ou viu na TV essa mesma frase milhares de vezes. A ciência - ou a medicina - está mais perto da cura do câncer. Então, prepare-se para um choque. O câncer não tem cura - pelo menos não no sentido de que um dia ninguém mais vai ter câncer. No entanto, depois de 30 anos de pesquisas, a estratégia de combate está mudando. "Você só consegue encontrar tratamentos para doenças quando sabe como elas funcionam", ensina Bert Vogelstein, professor da Johns Hopkins University e autor de um trabalho que virou um clássico, mostrando passo a passo como uma célula do cólon dá origem à doença. A tendência, hoje, é enfrentar o câncer como um problema crônico (como a hipertensão ou a diabete), administrável como a aids (com um coquetel de medicamentos e terapias, dependendo da evolução da doença) e, como em ambas, quanto mais precoce o diagnóstico, melhor. Nos últimos 30 anos, os cientistas aprenderam que câncer é uma doença dos genes que controlam quando as células de organismos complexos - galinhas, cães e gatos, árvores - devem se dividir. Sua freqüência dobra a cada década de vida do ser humano e, como a população do planeta está envelhecendo, os casos devem aumentar. Não é que não existisse câncer 2.000 ou 1.000 anos atrás, é que a maioria das pessoas não vivia o bastante para que a doença aparecesse. Mutações - O câncer, de certa forma, é inevitável - mesmo se todo mundo deixar de fumar, de comer alimentos gordurosos, de torrar sob o sol para pegar um bronzeado, ainda assim as pessoas teriam alguma forma de câncer. "As mesmas mutações aleatórias que garantem a variabilidade genética da nossa espécie estão na origem do câncer. É o preço que pagamos por sermos organismos com células altamente especializadas", diz Andrew Simpson, diretor do Laboratório de Genética do Câncer do Instituto Ludwig. O que o cigarro, a exposição excessiva ao sol, as dietas carregadas de conservas ou de gorduras fazem é aumentar e acelerar absurdamente a probabilidade de essas mutações se acumularem. Antes da 2.ª Guerra, eram raríssimos os casos de mulheres com câncer de pulmão, mas depois que elas começaram a fumar os casos aumentaram e muito. Os japoneses eram campeões de câncer de estômago, mas a mudança de hábitos alimentares mudou esse quadro. Evitar a exposição a agentes causadores de câncer reduz o risco de aparecimento da doença. É o mesmo que cruzar toda a Avenida Paulista, em São Paulo, todos os dias respeitando os semáforos ou acelerando toda vez que eles estiverem vermelhos para você: o risco de acidente sempre existe, mas no segundo caso a probabilidade de não completar o percurso é enorme. Novos alvos - Nesses últimos 30 anos, só o governo americano investiu US$ 46 bilhões em pesquisas sobre o câncer - some-se a isso o que fundações e indústrias farmacêuticas de todo o mundo também investiram. A corrida agora é traduzir esse conhecimento em resultados práticos, que garantam ao paciente não apenas sobrevida, mas qualidade de vida. Isso significa novas drogas, específicas para cada tipo de câncer. E de preferência num prazo relativamente curto, porque há uma cobrança da opinião pública, que, afinal, paga a conta das pesquisas sob a forma de impostos. É só na cabeça do dr. Albieri da novela que cientistas não dão a mínima para o mundo real. O câncer não é uma doença que dá no pulmão, na mama, no estômago. O câncer, na verdade, são os cânceres, mais de cem doenças diferentes, cada uma caracterizada por mutações em diferentes genes, que vão exigir tratamentos e abordagens diferentes. Três mulheres com câncer de mama de 1 cm de diâmetro podem ter três doenças distintas, com prognósticos diferentes. Só agora, os cientistas estão começando a distinguir umas das outras, a nível molecular. Coquetel - "A gente está aprendendo a basear o tratamento na biologia molecular, a tratar as células que têm a mutação e preservar as normais e isso significa dispor de um arsenal de drogas específicas para cada alvo molecular, porque a doença é complexa", explica o médico baiano Caio Rocha Lima, pesquisador do H. Lee Moffitt Cancer Center, da Universidade do Sul da Flórida. Lima pesquisa o uso de coquetéis de drogas no tratamento da doença. A estratégia é muito semelhante à usada hoje para a aids. A idéia é ter em mãos um arsenal específico: se duas ou mais drogas não funcionarem ou se o câncer se tornar resistente a elas, o médico vai dispor de duas ou três alternativas para "cercá-lo" mais à frente. Trata-se de ganhar tempo. Não um ou dois anos, mas 10, 20 ou 30.

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